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Música - Crítica/show
Led Zeppelin tem um reencontro com a sua antiga grande força
Ritmo está mais desacelerado, mas banda se preparou desde maio para apresentação; blues foi central no show
BEN RATLIFF
DO "NEW YORK TIMES", EM LONDRES
Algumas bandas de rock
aceleram o ritmo quando tocam suas canções
antigas outra vez, décadas mais
tarde. Tocar rápido é uma espécie de escudo: uma maneira de
refutar a verdade inegável do
envelhecimento, de todo aquele entusiasmo irrecuperável e
aquela massa muscular perdida, e funciona como barreira
contra a importância cultural
reduzida de uma banda antiga.
Mas o Led Zeppelin desacelerou um pouco o ritmo. Na 02
Arena, em Londres, em seu primeiro concerto integral desde
1980 -sem John Bonham, que
morreu naquele ano, mas com
o filho dele, Jason, como seu
substituto natural-, a banda
reencontrou muito de sua força
antiga em tempos mais graciosos do que os das velhas gravações ao vivo.
A velocidade das canções foi
mais próxima à dos velhos discos da banda gravados em estúdio, ou menor ainda. "Good Times Bad Times", "Misty Mountain Hop" e "Whole Lotta Love" foram passeios confiantes e
tranqüilos; "Dazed and Confused" foi um glorioso arrastado
fatídico.
Tudo remete ao blues, em
que se arrastar graciosamente é
uma virtude e do qual o Led
Zeppelin tirou metade de suas
idéias iniciais. O vocalista da
banda, Robert Plant, não quer
que nos esqueçamos disso: ele
apresentou "Trampled Underfoot" explicando sua conexão
com "Terraplane Blues", de Robert Johnson, e mencionou
Blind Willie Johnson como a
inspiração de "Nobody's Fault
But Mine". (Além disso, a banda passou dez minutos de deleite em cada uma de outras duas
canções de blues de seu catálogo: "Since I've Been Loving
You" e "In My Time of Dying".)
Ahmet Ertegun, a quem o
concerto foi dedicado, teria ficado satisfeito -certo, como
estava, da importância fundamental da música negra sulista
para a cultura americana.
Ertegun, morto no ano passado, foi quem levou o Led Zeppelin a assinar com a Atlantic
Records, e o concerto da segunda-feira foi um evento único
em benefício do Fundo Educacional Ahmet Ertegun, que vai
oferecer a estudantes de música bolsas de estudo em universidades dos EUA, da Inglaterra
e da Turquia, o país de origem
de Ertegun.
Abertura
Ao final do show de mais de
duas horas, já era difícil recordar que qualquer outro artista
havia se apresentado. Mas a
banda foi precedida pela Bill
Wyman's Rhythm Kings -um
divertido show de R&B com vocalistas que se revezaram, como Paolo Nutini e Albert Lee,
além de Paul Rodgers e Foreigner. Todos eles gravaram anteriormente para a Atlantic sob a
direção de Ertegun.
A apresentação do Led Zeppelin foi marcada por uma espécie de serenidade em alto volume. Para começo de conversa, foi bem ensaiada: o planejamento e os ensaios vinham
acontecendo desde maio.
Em lugar de seus guarda-roupas coloridos de tempos
passados, os integrantes usaram sobretudo preto. Diferentemente de Mick Jagger, Robert Plant -que, aos 59, é o
mais jovem dos membros originais- já não anda ou gesticula
como uma mulher excitada.
Ele não consegue mais alcançar algumas das notas mais altas, mas, com a exceção de uma
tentativa fracassada nesse sentido em "Stairway to Heaven",
encontrou outras trajetórias
melódicas adequadas. Cantou
com autoridade e dignidade.
Quanto a Jimmy Page, seus
solos de guitarra não foram tão
frenéticos e articulados quanto
eram no passado, mas isso reforçou o fato de que sempre foram secundários em relação
aos refrães, que na segunda-feira foram enormes, fortes e gloriosos. (Mas Page não deixou de
usar um arco de violino em seu
solo em "Dazed and Confused",
na maravilhosa e estranha sessão do meio da canção.)
O baixo de John Paul Jones
ficou um pouco perdido na
acústica do 02 Arena -como
todos os espaços desse tipo, o
02, que tem lugar para 22 mil
pessoas, não tolera bem as freqüências baixas-, mas formou
um conjunto perfeito com Bonham. Quando se sentou para
tocar teclado em "Kashmir", "No Quarter" e algumas outras
canções, ele simultaneamente
operou os pedais do baixo com
seus pés, mantendo a mesma
batida atrasada.
E o que dizer de Jason Bonham, o grande ponto de interrogação naquele que foi -não
há como comprovar isso cientificamente, mas aceitemos que
foi, sim- o reencontro de rock
mais ansiosamente aguardado
em uma era repleta desses
reencontros?
Ele é especialista nas batidas
de seu pai -uma enciclopédia
ambulante de todas as variações delas, em todas as gravações existentes. E, excetuando-se alguns momentos pequenos
em que acrescentou alguns toques, Jason Bonham se ateve
ao som e ao clima do original.
As batidas no tambor de corda não tinham exatamente o
mesmo timbre, aquele som
bárbaro, reverberante. Mas,
quando o show adentrou sua
segunda hora e alguns dos problemas de som foram sendo
corrigidos, o espectador se descobriu deixando de se preocupar com isso. Tudo acabou funcionando.
O Led Zeppelin já teve semi-reencontros algumas vezes no
passado, mas sem muito sucesso: apresentações curtas e problemáticas no Live Aid em 1985
e no concerto do 40º aniversário da Atlantic Records em
1988. Mas este foi um concerto
de reencontro no qual a banda
investiu, apesar de não ter planos para uma turnê futura; entre as 16 canções apresentadas,
houve uma que ela nunca antes
havia tocado ao vivo: "For Your
Life", do álbum "Presence".
O clima de emoção e excitação do público era extremo e
genuíno; os urros da multidão
entre um bis e outro foram devoradores. Ao final, enquanto
os três membros originais agradeciam os aplausos, Jason
Bonham se ajoelhou para fazer
uma reverência diante deles.
Tradução de Clara Allain
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