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"Pixo" racha opiniões nas artes
Ao aproximar a manifestação, Bienal adentra campo minado por ressentimento da invasão de 2008
Opositores ao projeto criticam arte que "vandaliza" e "destrói'; artista diz que atitude "autêntica" foi ataque à 28ª edição do evento
DA REPORTAGEM LOCAL
Horas depois de a Folha noticiar que os pichadores, algozes da 28ª Bienal de São Paulo,
entrariam na edição de 2010 da
mostra pela porta da frente, no
Twitter já se debatia o tema.
A artista plástica e twitteira
Pinky Wainer saiu na frente:
"Como é que alguém pode aceitar um convite de quem lhe
mandou prender?", questionou, referindo-se à prisão da
pichadora Caroline Pivetta durante a invasão de 2008. "Como é que o conceito de arte
muda a este ponto em dois
anos?", disse.
Procurado pela reportagem,
o curador da Bienal atacada pelo grupo, Ivo Mesquita, preferiu não se posicionar: "Não vi o
projeto. Não tenho nada a dizer". Na ocasião do ataque, no
entanto, Mesquita chamou a
ação de "vandalismo agressivo
e autoritário" e escreveu, em
artigo para a Folha, que convidar os pichadores para debater
ou pichar a Bienal seriam ações
"populistas e instrumentalizadoras".
Baixo Ribeiro, da galeria
Choque Cultural, atacada pelo
grupo em 2008, diz "respeitar o
trabalho dos curadores".
Procurado pela Folha, o
Centro Universitário Belas Artes, alvo da primeira invasão do
grupo em junho de 2008, não
se manifestou.
Campo minado
O curador-geral da 29ª edição da mostra sabe que a participação do "pixo" coloca o
evento num território minado,
que ao mesmo tempo reforça a
temática de relacionar arte e
política, pretendida como esfera do "desentendimento".
"A nossa aposta é em descobrir formas de tratar do assunto com integridade de ambas as
partes, sem que instituição e pixadores cedam completamente
ao universo da outra", escreveu. (leia entrevista ao lado)
Para ele, a invasão foi um
protesto frente a uma situação
de exclusão. "Se é verdade que
houve infração de leis pelos pixadores, não existiu o esforço
para entender o ocorrido."
Djan Ivson, 25, pichador que
participou das ações e que já
participou de exposição na
Fundação Cartier, em Paris,
defende a proposta: "A pichação tem todo direito de ser reconhecida pelo circuito artístico. Apesar de ser feita de forma
ilegal, ela exige técnica e talento. Os pichadores nunca tiveram instrução para pintar e desenvolveram uma forma selvagem de expressão".
Agressão
No meio das artes, o anúncio
dividiu opiniões. "Com tantos
artistas precisando de espaço,
acho ruim eles optarem por
uma plataforma perversa, que
agride", avalia Alessandra D'Aloia, presidente da Associação
Brasileira de Arte Contemporânea. "Trata-se de uma agressão. Portanto, sou contra. É por
isso que o mundo está assim."
No mesmo tom, Márcia Fortes, da galeria Fortes Vilaça, se
declara "radicalmente contra
toda arte que vandaliza". Para
ela, se o trabalho dos pichadores "continuar a ser a destruição do trabalho dos outros, ele
não merece atenção".
Já Nelson Aguilar, curador
de duas edições da Bienal (22ª,
em 1994, e 23ª, em 1996), acha a
proposta interessante. "A última Bienal foi uma espécie de
necrotério. Esta aponta para
uma ressurreição."
Alexandre Orion, artista que
cria intervenções urbanas em
São Paulo, diz que "a coisa mais
legítima que a pichação poderia
fazer já foi feita durante a invasão. Qualquer tentativa da Bienal de absorver isso vai ser frustrada", calcula.
Para Marcelo Cidade, artista
que se diz decepcionado com
"uma geração de grafiteiros que
hoje decoram a casa de madames", a pichação pode estar na
trilha da domesticação.
Já o artista plástico Nuno Ramos considera a inclusão institucional como algo inevitável.
E lembra: "O único parâmetro
que a Bienal tem de respeitar é
de que seja arte boa. Tomara
que eles sejam bons."
(FERNANDA MENA)
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