São Paulo, terça-feira, 15 de junho de 2004

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FERNANDO BONASSI

Breve estudo sobre a saúde dos vampiros

Companheiros e companheiras, foram encontrados vestígios de vampiros tarados grudados nos seios esplêndidos da Pátria Amada! Pobre coitada! Salve, salve!
Conforme informações de inteligência policial, por incrível que pareça uma coisa dessas, a operação também envolve pernilongos contaminados, ratos malcheirosos, sanguessugas libidinosos, corvos parasitários e avestruzes tímidas. Se bois gordos havia no pasto, podem ter sido retirados à força e à pressa dessa briga, já que havia muita rivalidade nas questões de divisões de tais patrimônios semipúblicos.
Um vampiro é um cadáver esquisito que se ergueu da sepultura para sugar a seiva mais pura de nós outros, os mais vivos do que eles. São eles, no entanto, os mais espertos. Podem se dedicar a qualquer função na burocracia das causas perdidas. Excelentes datilógrafos diplomados, revelam altíssimo desempenho na digitação e manipulação das letras embaralhadas nos teclados piratas dos PCs arrombados do Tesouro Nacional.
Como se sentem escolhidos profissionais, nada mais coerente que se favoreçam em bacanais de processos fraudulentos. Por essas e outras menos compreensíveis, seu salário é tomado pelo mérito. O mesmo mérito do advogado da causa própria, é claro. Pois não há nada mais egoísta do que vampiro engravatado dando na vista nas academias de tênis, nos campos de golfe ou nas marinas reformadas por operários de construção, que haverão de se cansar desses salários piores, sem as mesmas comissões na extorsão.
Seu apetite pela vida reduz-se à causa de matar. Como não podem ver sangue, não o fazem com as próprias mãos, mas pregando os dentes afiados nos canos fraturados dos orçamentos monetários. Há vampiros internos e vampiros externos. Uns sugam as licitações de remédios, as compras de vacinas, os recursos logísticos; outros rebaixam as cotações de nossas moedas, estimulam nossos vícios e invejas com emissões de caráter consumista, casamentos reais e entregas de prêmios sensacionalistas, armados, votados e comprados nos corredores escuros dos congressos e ministérios misteriosos.
Lobistas cheios de hobbies, eles têm jet-skis, carros importados na garagem, dinheiro estocado para malandragem e casas grandes de fazer inveja aos demais senhores de escravos destas glebas morféticas e indústrias de fachada.
Aos mais medrosos, convém informar que a senzala esgotada permanece dominada.
São seres concursados e especializados em tirar a substância das veias das pessoas de bens, cujo mal foi terem pago em dia os boletos que os impostos impuseram. Quanto aos que devem ao fisco, não são menos prejudicados no risco de serem lesados por tais bichos viciados.
Antigos vampiros licitantes costumam agir num único bando lesivo, tendo relações extraconjugais sem camisinha com morcegos negros falidos, plasmando interesses escusos e doenças venéreas. Há inclusive evidências da presença de vampiros diabéticos, vidrados nas ocorrências de concorrências de insulina ou, quem sabe, em roubar um docinho de merenda da boca das criancinhas indefesas.
Nessa situação, certos vampiros envenenados podem muito bem entrar em rota de colisão, brigando como abutres enciumados, derrubando-se nos dólares lavados e nos preços acertados. Uns os querem baixos. Não por um desejo de gente saudável, mas pela perversidade de cavoucar cada dia o seu pouquinho, mantendo-se a ferida aberta e com aspecto pútrido.
Há vampiros em todos os desníveis e para todos os desgostos!
Há também os meio moralistas, que evitam mostrar os braços para investigação, temendo serem colhidos na mesma trama que ajudaram a revelar, aumentando os índices de corrupção de seu próprio desgoverno. Será por isso que esses empoados empedernidos não gostam de espelhos polidos? Se ficarmos quietinhos, como querem os que deixam o melhor de si em contas da Suíça, será que ainda seremos mordidos pelo leão ferino das receitas?
O que diriam os que ficaram sozinhos, implorando um doador compatível nas esquinas dos acidentes anunciados, nos prontos-socorros abandonados, nas filas intermináveis dos postos de atendimento e nos guichês dos cartórios de protestos inúteis?
Porque seus advogados lhes exigem o direito de defesa, pode ser que algum juiz bacana e suscetível a essa violência toda conceda o favor do habeas corpus para refeição dos réus enclausurados. As sindicâncias costumam inocentá-los de tudo o que forem acusados. São humanos, são mortais... podem errar, não é mesmo?
É? Sim? Não? Que corporação médica vai assumir agora a irresponsabilidade por curar a todos nós dessas sacanagens endêmicas?
Quando um homem aceita sua condição de mortal, dizem os especialistas, quando percebe que só a maldade de Deus pode rivalizar com os seus quereres mesquinhos, seu vampirismo desaparece. Assim, conforme ensinam aqueles eslavos dentre os menos comunistas, aqueles mesmos que lutaram as guerras genocidas e conheceram nas carnes magras o custo da fome anêmica: "Vampiro bom é vampiro morto/basta uma boa estaca martelada no coração".
P.S.: É preciso ter muito cuidado com os hemoderivados que podem ser espirrados nessas ações terroristas. Onde esses tipos sangram, a terra seca para sempre, podendo, numa questão de tempo, ser leiloada para a reforma agrária dos próximos mandatos. Estejam avisados. Fim da aula de moral & cívica.


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