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ACONTECE
"CHICO PINHEIRO E CONVIDADAS"
Maria Rita Mariano, 24, divide palco com o violonista e a cantora Luciana Alves
Filha de Elis estréia entre estrela e anti-estrela
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL
U ma nova cantora brasileira
tem subido constantemente
no palco minúsculo do Supremo
Musical, em São Paulo -ela, que
se chama Maria Rita Mariano e
tem 24 anos, começa ali hoje nova
temporada, que seguirá pelas próximas duas segundas-feiras.
Ao contrário de todas as novas
cantoras brasileiras, essa não quer
que se espalhe a notícia de sua estréia. Não quer dar entrevistas,
não quer que seu nome fique conhecido, nem divulgar o show.
Por quê? Ela não explica, mas
deve ser porque sua mãe é Elis Regina (1945-82), para milhões de
brasileiros a maior cantora que já
pisou neste solo.
Elis morreu quando ela tinha
quatro anos e, diz-se, a comparação com a mãe que mal conheceu
é tudo que Maria Rita quer evitar.
A bordo daquele cenário inicial
e dessa estratégia, Maria Rita pretende escapar a todo custo das
comparações hereditárias. Já não
tem conseguido, e deve continuar
não conseguindo.
O show que hoje recomeça, por
exemplo, nem é dela. É do violonista e compositor Chico Pinheiro. Maria Rita interpreta poucas
canções e se alterna no palco com
outra cantora, a delicada Luciana
Alves. No entanto, só se fala de
Maria Rita. A curiosidade prévia é
herança da mãe, é claro.
Entre os espectadores do show
lotado, atraídos à revelia do bloqueio de divulgação pela equipe
de Maria Rita, predominam senhores e senhoras que eram jovens à época de "Arrastão" (65).
O público de Chico, Luciana e
Maria Rita não é ainda o deles,
mas sim o de Elis, à espera de ressurreição tipo "ainda somos os
mesmos e vivemos como nossos
pais".
Maria Rita acerta ao repudiar o
mito. E erra, por isso mesmo, ao
se portar como estrela que ainda
não é. A estratégia passa a oscilar
entre horror ao mito comparativo
e marketing artístico invertido.
Seja como for. No palco, semi-escondida entre a pressão sanguínea e um aparato musical que ainda é morno, existe uma artista,
uma nova artista.
O besteirol comparativo correrá
solto, mas será inútil. Pelo pouquíssimo que se ouve no show-laboratório, a angústia da influência não torna Maria Rita uma artista insegura, nem hesitante, nem
despersonalizada.
Isso se evidencia quando ela
canta "April Child", do maestro
Moacir Santos, mito samba-jazz
da geração de Elis. O peso histórico/hereditário (familiar, social,
musical) sobrevoa o palco, mas
quem parece vencer, trancafiando todo o resto, é uma intérprete
sorridente, feliz, inebriada pelo
prazer incontrolável de cantar.
Por isso, e não por qualquer razão colateral, a excessiva juventude e a forte segurança dessa moça
assustam, impressionam e alegram as experientes cortinas do
Supremo Musical. Seus ácaros farejam vida musical arejada e se
põem em rota de fuga.
Quem há de purgar o peso da
herança, enfim, não serão os
grisalhos de lágrimas pingando que lotam o cubículo paulistano. Nem a garotada que
Maria Rita ainda não começou
a atrair para perto de si, talvez
por saudosismo próprio. Muito menos a imprensa fúnebre
que insistirá sempre em vê-la e
repetir "Elis, Elis, Elis".
Quem há de exorcizar a presença de Elis Regina (e também a do pai Cesar Camargo
Mariano, vivo e tão mítico
quanto a mãe nos círculos musicais) é Maria Rita Mariano,
mais ninguém. A senha ela já
conhece: é só carregar palco
abaixo e vida afora o bom humor, a ingenuidade e a alegria
que já exibe ao cantar, desde
novinha e iniciante.
Chico Pinheiro, Maria Rita
Mariano e Luciana Alves
Onde: Supremo Musical (r. Oscar Freire, 1.000, tel. 3062-0950)
Quando: hoje, dia 22 e dia 29, às 22h
Quanto: R$ 25
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