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LIVROS
A permanência do pós-moderno
Organizadora de fortuna crítica da arquitetura de 1965 a 1995 diz à Folha que temas do pós-modernismo ainda são relevantes
Ensaios abrangem período
marcado pela emergência
do pós-modernismo, a partir
dos manifestos de Aldo
Rossi e Robert Venturi
GUILHERME WISNIK
COLUNISTA DA FOLHA
Foi recentemente lançado no
Brasil o livro "Uma Nova Agenda para a Arquitetura" (Cosacnaify, tradução de Vera Pereira,
R$ 85, 664 págs.), antologia teórica organizada pela pesquisadora americana Kate Nesbitt,
cobrindo a produção recente
que vai de 1965 a 95, e que coincide com a emergência do pós-modernismo a partir dos manifestos de Aldo Rossi e Robert
Venturi.
Professora na Escola de Arquitetura da Universidade da
Virgínia, Nesbitt recolheu uma
importante fortuna crítica do
período. Estão presentes no volume as férteis contribuições
da semiótica, do estruturalismo, do pós-estruturalismo, da
fenomenologia e do desconstrucionismo ao debate arquitetônico, com destaque ao diálogo entre o filósofo Jacques Derrida e os arquitetos Peter Eisenman e Bernard Tschumi.
Em seu mosaico crítico aberto, o livro apresenta tanto visões favoráveis à incorporação
arquitetônica do "vernáculo
urbano comercial", quanto formulações de resistência ao papel homogeneizador da cultura
de consumo. Este é o caso dos
pensadores da "escola de Veneza", como Manfredo Tafuri, e
de defensores de um "regionalismo crítico" aferrado à dimensão tectônica da construção, como Kenneth Frampton.
No Brasil, esse importante
debate teve, até hoje, pouca penetração. Espera-se, portanto,
que essa iniciativa se desdobre
em novos diálogos com a produção internacional, ecoando a
bela, polêmica e isolada exposição de Eisenman no Masp, em
1993. Em entrevista à Folha,
Nesbitt explica como seu livro
aborda 30 anos de debate sobre
o pós-modernismo e diz considerar as noções de "lugar" e de
"sustentabilidade" fundamentais na resistência à globalização massificadora.
FOLHA - Passados 11 anos desde a
edição do seu livro, e considerando-se o desgaste da idéia de pós-modernismo nesse período, a senhora
acha que a mesma "agenda" se
mantém?
KATE NESBITT - Eu sinto que a
maioria das tendências debatidas no livro continuam tão relevantes quanto em 1995,
quando foi publicado. O peso
individual dessas preocupações pode ter se alterado. Mas,
pelo fato de o assunto do livro
não ser o "estilo" pós-moderno
(o que seria uma atitude historicista em relação ao projeto),
os temas mantêm relevância.
FOLHA - A teoria crítica pós-moderna amplia o leque de referências
conceituais aplicadas à arquitetura,
incluindo também uma relação renovada com a história. Que contribuições aparecem nessa abertura?
NESBITT - O esforço de compreender a relação dos arquitetos com a história -uma relação mais complexa do que a rejeição modernista à história-,
percorre vários dos ensaios.
Além disso, a significação e o
sentido do mundo visual foram
explorados através das lentes
de diversos paradigmas literários e filosóficos. Assim, a arquitetura é obrigada a se considerar em relação ao passado.
Entre os temas abordados, um
dos mais interessantes é a
construção do "lugar".
Recentemente, Carol Burns
co-editou uma antologia que
amplia a discussão sobre o tema, tal como foi explorado no
meu livro. Essa ênfase no local
está ligada à expressão da noção de lugar, que está cada vez
mais ameaçada por um mundo
globalizado, com lojas de Mc
Donald's em cada esquina, de
Charlottesville a São Paulo.
Nos meus 11 anos de magistério, tanto os estudantes de projeto quanto os de teoria passaram cada vez mais a desenvolver projetos com base em uma
aprofundada leitura do sítio,
fosse ele urbano ou rural. Portanto, diferentemente de uma
"nave espacial" modernista
plantada numa tábula rasa,
uma leitura seletiva do local determina o desenho do edifício
que deverá ocupá-lo. De modo
coerente, colaborações entre
arquitetos e paisagistas podem
ser vistas na prática atual.
FOLHA - Como a senhora vê o futuro da chamada "green architecture", representada, por exemplo, pelos mais novos e celebrados edifícios
de Manhattan: o Seven World Trade
Center e a Hearst Tower? Será que
essa "arquitetura sustentável" estaria deixando o papel de resistência
(ecologia) para assumir um papel de
acomodação, a ponto de tornar-se
um novo "estilo internacional"?
NESBITT - A construção do lugar
pode também ser abraçada pelo movimento de arquitetura
sustentável ou ecológica, utilizando características do local
para criar um ambiente mais
eficiente em termos energéticos e humanos. Acho improvável que a arquitetura verde, ou
ecológica, se torne um estilo,
uma vez que se baseia em princípios de projeto previstos para
muitas gerações, em grande
sensibilidade ao local e em materiais seguros.
FOLHA - Uma das tônicas da produção artística do período, segundo as
matrizes críticas pós-estruturalistas,
é a idéia de "morte do autor". Como
interpretar, a partir daí, o movimento atual em direção contrária, em
que muitos arquitetos parecem reivindicar o papel do artista?
NESBITT - Recentemente, ampliou-se o papel da tecnologia
digital na formatação do projeto. Essa tendência estava começando na ocasião e o assunto
é tratado brevemente no livro.
As faculdades estavam começando a integrar ferramentas
de Autocad. Atualmente, os
projetos refletem a ferramenta
empregada para criar a imagem: arquivos compartilhados
via e-mail com colaboradores
distantes em países estrangeiros. O computador despersonaliza o desenho, removendo o
autor. Os arquitetos hoje projetam edifícios para locais no
mundo todo, locais que, muitas
vezes, nunca viram. Como isso
vai mudar a experiência do visitante? Projetos sempre empregam novos materiais, mais leves e mais elásticos, que dão
forma à aceleração da vida na
era da internet, expressando
fluxo. Nós nos movemos além
da tensão dinâmica do modernismo para uma sensação pós-moderna de "fluxo". O computador permite desenhar e especificar formas e materiais que
antes eram muito complexos
para serem representados.
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