FABRICIO VIEIRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Após 20 anos de carreira, o saxofonista Ivo Perelman decidiu assumir um novo risco: lançar quatro álbuns de uma vez. Por trás da empreitada, um súbito e inesperado fascínio pela obra de Clarice Lispector (1920-1977).
Cada disco recebeu o título de um livro da autora. Mas a associação explícita com o texto dela fica por aí.
"Minha intenção nunca foi a de fazer uma releitura instrumental dos livros. A obra da Clarice surge como um amálgama de onde brotaram os sons", afirma Perelman, 49, que redescobriu a escritora em um evento em Nova York no ano passado.
Os álbuns, que foram lançados apenas no exterior, são independentes, tendo contado cada um com músicos e formações diversas.
"The Apple In The Dark" ("A Maçã no Escuro") e "The Stream of Life" ("Um Sopro de Vida") são duos com os bateristas Gerry Hemingway e Brian Wilson, respectivamente. Os outros discos são trios, com Perelman acompanhado por cordas.
Radicado nos EUA desde meados da década de 1980, o saxofonista paulista é um dos mais respeitados nomes do free jazz -estilo mais experimental da música negra norte-americana.
"O melhor é pensar que os discos foram criados em meio a um clima de embriaguez com o texto da Clarice", afirma o músico, por telefone, de Nova York.
O resultado surpreende e inquieta. Os duos com os bateristas são vigorosos e intensos, revelando a face visceral da escritura clariceana.
Já "Near to the Wild Heart" ("Perto do Coração Selvagem") e "Soulstorm" (título em inglês para uma coletânea de contos) seguem caminhos mais fluidos e etéreos. Neles, sax e cordas criam um espaço de divagação sonora que poderia ser acompanhado, com interação, pela leitura de textos da autora.
A música de Perelman não foi feita para consumo rápido. Como ocorre com "Água Viva", possivelmente a obra mais abstrata de Lispector, as composições do saxofonista demandam entrega e atenção irrestritas.

NEAR TO THE WILD HEART
GRAVADORA NotTwo Records
QUANTO a definir
AVALIAÇÃO bom


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