São Paulo, quarta-feira, 15 de setembro de 2010 |
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Nuno Ramos equaliza o sublime eo grotesco Artista tem individual com árvores e aviões no MAM-Rio e está na Bienal Ele compara seu viveiro de urubus a "velório e canção de ninar" e diz que sua obra no Rio está no "limite do cafona"
SILAS MARTÍ Folha - Como a obra que você mostra agora no MAM se relaciona com o trabalho da Bienal de São Paulo? Há uma dimensão política nas duas? Nuno Ramos - Passei esse ano pensando na Bienal e aqui. Quis fazer uma peça de algum modo política, entender a capacidade imagética de carimbar uma época, alegorizar um tempo. Me lembrei dos urubus e dessa litania que o trabalho é, um trabalho de luto muito calado. Tinha um repouso, não era a violência em ato, era uma coisa calma, aquelas canções, os bichos voando, uma espécie de desaceleração. A obra inteira tem algo entre velório e canção de ninar. "Fruto Estranho" [trabalho com os aviões nas árvores no MAM] está no limite do cafona. Na Bienal é austero, esse é mais histérico. É outra fusão entre o vivo e o morto. Acredita que isso tem a ver com o momento político e econômico atual do país? É um momento de grande aceleração sem direção, um segundo desenvolvimentismo. Também há uma cegueira e falta de capacidade de projetar. É uma espécie de agora dilatado que o Brasil sempre vive. Somos o "nunca antes neste país" eterno. Sinto que esse ufanismo só vai ter algum sentido quando enraizar. O Brasil não superou ainda essa vertigem superficial, o modo de operar a vida como se fosse acabar amanhã. É um pouco eufórico, não tenho tesão nisso. E com o momento da Bienal? Essa Bienal vem com uma força guardada. A "Bienal do Vazio" foi das coisas mais idiotas que o Brasil já fez. Essa vem suceder uma cagada monstruosa. Ainda assim, esse museu está caindo aos pedaços. O mundo institucional não é o que já foi, embora haja novas forças. Sua obra parece bem menos abstrata agora, marcada por contrastes mais aguçados. É o novo e o velho, a soda e a banha, o cachorro e o asfalto. Essa passagem entre matéria e sentido é o que parece estar acontecendo. A matéria foi criando raiz semântica, buscando uma linguagem. Ponho tudo em fusão, cópula. Eu sou romântico, acredito na verdade que resulta disso. Quero que o choro e o pau duro transfiram de um para o outro alguma coisa em comum. Gostaria de equalizar o sublime da música e o grotesco de uma boceta. Texto Anterior: "Estou no melhor momento", diz Frampton, 60 Próximo Texto: Raio-X: Nuno Ramos Índice | Comunicar Erros |
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