|
Texto Anterior | Índice
ARTES VISUAIS
EXPOSIÇÃO
Projeto na Tate Modern exibe obras de 13 crianças e adolescentes escolhidos entre 14 mil pessoas; brasileiro aborda a seca
Água transporta jovens à galeria londrina
MARIA LUIZA ABBOTT
DE LONDRES
Para artistas renomados do
mundo, fazer parte de uma exposição na Tate Modern, em Londres, é o auge da carreira. Para o
brasileiro Felipe Rodrigues, 16,
pode ter sido apenas o começo.
Rodrigues faz parte de um grupo de 13 crianças e adolescentes
escolhidos entre mais de 14 mil jovens artistas para expor suas
obras de arte na mostra "Splash!
Our Relationship with Water"
(Splash! Nossa Relação com a
Água), na galeria londrina.
A mostra integra um projeto
patrocinado pela empresa Unilever que pretende estimular a ousadia criadora de crianças e adolescentes, além de artistas consagrados, em temas relacionados
com a natureza. É parte dele a instalação do sueco Olafur Eliasson,
com projeções do sol, um enorme
espelho e uma névoa constante.
Em sua temporada na Tate Modern, a instalação tem provocado
admiração, mas também controvérsias, como tantas outras obras
apresentadas por esse que é um
mais respeitados museus de arte
contemporânea do mundo.
Imigrantes
Para a criação artística das
crianças, o tema do projeto da
Unilever é a água e o seu uso renovável. A obra de Rodrigues se destaca das demais: é a única em que
a água não aparece. É também
uma instalação, sem envolver
pincéis nem cinzéis.
A obra chama-se "Retirante" e é
feita com folhas secas, gravetos,
capim e terra escura. Por cima,
pares de chinelo de borracha e tênis, de tamanhos diferentes, mas
todos gastos pelo uso.
"Quis representar os imigrantes
que saem do Nordeste em busca
da água na cidade grande", diz
Rodrigues à Folha, na abertura da
exposição, na última quarta-feira.
"Tentei conscientizar as pessoas
para ver se as coisas mudam, porque, se continuarmos assim, não
vai sobrar lugar para fugirmos em
busca da água."
Para demonstrar sua preocupação com a preservação do meio
ambiente e o interesse em projetos de desenvolvimento sustentável, Rodrigues utilizou apenas
material reciclável. "Pedi sapatos
para os vizinhos e amigos e quanto mais desgastados, melhor, pois
retirante não usa sapato novo",
explica o brasileiro.
E, se arte é fazer com que "os outros enxerguem algo novo no que
se vê todos os dias", como disse
Clive Butler, diretor da Unilever,
na inauguração da mostra, o trabalho de Rodrigues se encaixa na
definição. Para quem olha sua
instalação, não há dúvidas. É a caminhada dos retirantes que abandonam o sertão no auge da seca,
feita com coisas que se vê todos os
dias para criar uma imagem nova
de uma tragédia que simboliza o
drama da falta de água.
Rodrigues está na sétima série
da Escola Estadual Machado de
Assis, em Vespasiano, Belo Horizonte (MG), um dos 14 municípios do Brasil em que a Unilever
desenvolve programas na área de
educação. A empresa, segundo
Norma Fernandes -representante da Unilever nesse projeto-,
gasta R$ 5 milhões em projetos
comunitários, de educação e saúde por ano, no Brasil.
Arte ao redor do mundo
O projeto artístico envolveu
crianças de 13 países do mundo.
Só no Brasil, participaram mais
de 2.000 obras de arte. Um júri
nos países selecionou três trabalhos, que foram enviados a Londres, onde foram submetidos à
avaliação de especialistas.
Foi escolhido um de cada país
pelo júri, que era formado por
Niall Fitzgerald, presidente da
Unilever; Susan May, curadora da
Tate Modern; Vicken Parsons, artista britânico; Tim Marlow, escritor e crítico de artes, e Victoria
Neumark, especialista em educação do jornal britânico "The Times". "Ficamos muito impressionados com o alto padrão das
obras pré-selecionadas", diz Tim
Marlow.
Para Felipe Rodrigues, viajar a
Londres e ter uma obra na exposição da Tate Modern, foi decisivo
para seu futuro e seu interesse pela arte. "Desenho, faço artesanato
com material reciclável e agora
vou voltar e me dedicar ainda
mais", diz. "Quero fazer arte, mas
arte engajada, voltada para a ecologia."
A mãe de Rodrigues é professora de arte na escola em que ele estuda. O interesse pela arte, diz,
veio da influência da mãe, e o
apoio da professora de arte de sua
série, Aloma Moraes, foi fundamental. Foi ela quem ajudou, sugeriu e estimulou Rodrigues na
criação de sua obra.
Texto Anterior: Nelson Ascher: Mais respeito com os jihadistas! Índice
|