São Paulo, segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Texto Anterior | Índice

Livro visita região do Alto Rio Negro

"Cabeça do Cachorro" reúne textos de Drauzio Varella e fotos de Araquém Alcântara sobre a parte mais preservada da Amazônia

Com lançamento amanhã, título faz panorama histórico da região, onde 23 etnias indígenas vivem há 3.000 anos

EDER CHIODETTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

"Peque o mapa do Brasil. Olhe para cima e para a esquerda, no extremo noroeste do Estado do Amazonas. O contorno da fronteira com Venezuela e Colômbia não desenha a cabeça de um cachorro?". É dessa forma sucinta e precisa que o médico, escritor e colunista da Folha Drauzio Varella apresenta ao leitor a região do Alto Rio Negro, na qual o conduzirá numa expedição repleta de histórias, percalços e paisagens delirantemente belas que ganham cores no ensaio fotográfico de Araquém Alcântara no livro "Cabeça do Cachorro", que será lançado amanhã no Museu da Casa Brasileira, em São Paulo.
Umas das regiões menos habitadas do mundo, com densidade populacional de 0,25 habitante por quilômetro quadrado, a região da Cabeça do Cachorro, como é popularmente chamada, é também conhecida como a parte mais preservada da floresta amazônica. Segundo o arqueólogo Eduardo Neves, ali vivem 23 etnias indígenas há mais de 3.000 anos, que preservam costumes, como os idiomas falados há 500 anos.

Histórico detalhado
Apoiado em textos de expedições científicas realizadas na região no século 16 ou à Viagem Philosofica, organizada pelo Marquês de Pombal, em 1785, Varella, com a ajuda do sociólogo Jefferson Peixoto, consegue traçar um detalhado panorama histórico da região.
As ilustrações raras de traço refinado, do século 16, que representam a flora e a fauna amazônica, além das fotografias realizadas entre 1906 e 1907 pelo etnólogo alemão Theodor Koch-Grünberg (1872-1924), enriquecem sobremaneira a narrativa.
Um dos episódios que se destacam é quando o autor descreve a relação dos portugueses com os índios. Empossados como "diretores de índio", comerciantes locais, em 1754, invadiam tribos e mandavam mulheres e crianças para os aliados. Homens e meninos viravam mão-de-obra para o comerciante. "Com conivência do governo, as crianças que não fugissem ou morressem, eram levadas para trabalhar em casas de família", diz Alfred Russel, em texto de 1851.

Ensaio fotográfico
A segunda parte de "Cabeça do Cachorro" é dedicada ao Alto do Rio Negro contemporâneo, em ensaio fotográfico assinado por Araquém Alcântara, autor que detém o maior e mais relevante acervo de fotografias da fauna e flora brasileiras, acumulado nos seus quase 40 anos de carreira.
O ensaio começa com retratos em belos contrastes de luz e sombra de diversas etnias ribeirinhas, como os Baníua, os Curipacos e os Barés, para em seguida mostrar a relação desses com os rios Negro e Içana. Bonitas imagens de pequenas embarcações em tons azulados e prateados fazem a transição para a seqüência de fotografias em que os índios aparecem na floresta, em meio aos seus afazeres, rotinas.
Um registro de garimpo é a senha para a mudança de tom no ensaio. A partir daí vemos os índios (mal) integrados nas regiões mais urbanizadas, participando de cultos em igrejas evangélicas ou como mascates no comércio.
A última história narrada por Drauzio dá bem o tom desta mudança de hábitos ainda conflituosa. Numa reunião em que índios tucanos reclamavam da falta de energia elétrica na comunidade para um coronel do exército, um deles pegou o microfone e declarou: "Não sou mais índio nu como meu avô que vivia no mato. Também preciso de civilização, de energia e de computador em casa. Sou índio integrado, o que é melhor tem que ser meu. Tudo de bom que chega para o branco eu vou abraçando".


CABEÇA DO CACHORRO
Autor: Drauzio Varella e Araquém Alcântara
Editora: Terra Brasil
Quanto: R$ 145 (216 págs.)
Lançamento: amanhã, às 19h, no Museu da Casa Brasileira (av. Brig. Faria Lima, 2.705; tel.:0/xx/11/ 3032-3727)



Texto Anterior: Caramelos
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.