São Paulo, quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

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CRÍTICA ROCK

Almas gêmeas se encontram na arte

Em biografia, Patti Smith declara seu amor incondicional ao fotógrafo Robert Mapplethorpe

CENA CULTURAL DA NOVA YORK DOS ANOS 1960 E 1970 É PANO DE FUNDO PARA A RELAÇÃO ENTRE A CANTORA E O FOTÓGRAFO

DE SÃO PAULO

Entre as tantas biografias roqueiras recém-lançadas, o livro de Patti Smith é o que menos foca a música. Não por acaso, é o melhor deles.
Em "Só Garotos", o rock é pano de fundo. Não apenas o rock, mas também a ressaca da literatura beatnik, o início da contracultura e a revolução comportamental em curso na Nova York da segunda metade da década de 1960.
Acima de tudo, trata-se de uma história de amor. O relacionamento entre Patti e o fotógrafo Robert Mapplethorpe é contado de uma forma às vezes carinhosa, às vezes apaixonada. Desde que se conheceram, em 1967, quando eram dois jovens sem dinheiro no bolso e com uma fé cega em sua arte, até a morte dele, em 1989.
A narrativa abre com a manhã em que a autora recebe a notícia da morte do ex-namorado. Ela professa a condição dos dois como almas gêmeas e dedica as dezenas de páginas seguintes a justificá-la.
Uma das mais importantes vozes femininas da poesia americana, Patti faz isso com beleza e sedução.
Quando se conheceram, viviam de empregos modestos, quase bicos. Morando em lugares insalubres, que tratavam de enfeitar com os desenhos que produziam sem parar, e dividindo um único sanduíche no jantar, passam por um pequeno inferno antes de chegar ao reconhecimento -ela, como poeta e depois cantora de rock, e ele, fotógrafo.
São dois sonhadores. Sem dinheiro para comprar um mísero remédio para gonorreia, mas fazendo planos para conhecer Andy Warhol.
Essa fase "sarjeta" do casal rende bons momentos na história, como aquele em que Allen Ginsberg, já na época grande poeta americano, paga uma refeição a uma faminta Patti pensando que ela era um menino magrinho.
Quando vê que é uma garota, Ginsberg perde o interesse e a descarta. Anos depois, Patti já famosa, os dois ficaram amigos e riram muito disso.
Enquanto Patti alcançou popularidade de uma estrela do rock, Mapplethorpe ganhou uma aura polêmica que nunca perderia, mesmo que seus retratos de nus que tanto chocam parte do público americano sejam só uma das faces de seu trabalho.
Chega a comover o amor incondicional de Patti por Mapplethorpe. Ela aceita todas as mudanças do comportamento do amado: da insegurança tímida à confiança em excesso, das gravuras à fotografia, do jeito juvenil de namorar ao bissexualismo sem freio. Todo o tempo, ela sempre ao lado dele.
"Só Garotos" pode ser lido de duas maneiras. Como retrato de uma época e relato dos anos de formação de uma estrela do rock, satisfaz qualquer curiosidade, além do estilo envolvente de Patti Smith ao escrever prosa com momentos quase poéticos.
Como história de amor muito longe das convenções, o livro ganha sua dimensão de uma obra irresistível para românticos, sejam roqueiros ou não. (THALES DE MENEZES)

SÓ GAROTOS
AUTOR Patti Smith
TRADUÇÃO Alexandre Barbosa de Souza
EDITORA Companhia das Letras
QUANTO R$ 39 (240 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo




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