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60º FESTIVAL DE BERLIM
Em thriller, Scorsese empilha referências
"A Ilha do Medo", parceria entre o diretor e Leonardo DiCaprio, fora de competição, remete à estética de filmes noir
Cineasta diz que voltou a ter inspiração para fazer filmes pelo talento do ator, com quem começou a trabalhar em "Gangues de Nova York"
CRISTINA FIBE
ENVIADA ESPECIAL A BERLIM
Martin Scorsese, 67, ainda
gosta de brincar. Aceitou filmar
o roteiro de um suspense psicológico, "A Ilha do Medo", para
se divertir colando peças da
história do cinema hollywoodiano, na qual é expert.
Empilhou referências, organizou exibições para a equipe,
escolheu o cinema noir como
principal norte e, contra toda a
tecnologia de filmes como
"Avatar", apresentou, no 60º
Festival de Cinema de Berlim,
uma obra cuja estética remete
aos anos 30, 40 e 50.
Antes de citar inúmeras referências, Scorsese abre um bloco de papéis amassados e dobrados ao meio, que carregou
consigo para falar a um grupo
de jornalistas, anteontem.
"Fuga ao Passado", de Jacques Tourneur, "Let There Be
Light", de John Huston, "O
Processo", de Orson Welles,
"qualquer um" do Polanski,
"sempre Hitchcock"... A lista
segue, enumerada com a velocidade que lhe é característica.
Apesar de citar Polanski, ele
se nega a comentar o caso do diretor preso na Suíça por um
processo que corre nos EUA
desde 1978. "Vamos nos ater a
"Ilha do Medo". É uma boa pergunta, mas poderíamos ficar
horas falando disso", desvia.
Em 20 minutos de conversa,
é o único momento em que
Scorsese fica sério. Expansivo e
simpático, o diretor parece um
pai italiano em uma mesa de refeição. Com calças jeans, camisa listrada e blazer escuro, o seu
único acessório chamativo são
mesmo os aros grossos e escuros, que levam lentes bifocais.
Ele usa cada pergunta como
desculpa para contar uma longa história. Como começou sua
paixão pelo cinema? "Deve ter
algo a ver com ter asma aguda.
E com o fato de me sentir aconchegado. Porque eu não conseguia respirar. Era 1946, 47. E
meus pais não sabiam o que fazer comigo, então me levavam
ao cinema, e assim criaram um
laço emocional comigo."
E, ele, um laço com o cinema,
que o permitia sonhar com
aquilo que "nunca conseguiria
fazer. Andar a cavalo. Em cores.
Era impressionante". É esse tipo de fantasia que parece querer recriar para o espectador,
com "A Ilha do Medo", que deve estrear no Brasil em 12/3. "O
que importa é o entretenimento" -por isso mesmo, está fora
da competição do festival, diz.
Parceria
O thriller, ambientado em
uma ilha usada como hospital
psiquiátrico, nos anos 50, é um
quebra-cabeça cuja primeira
peça é a ida do protagonista
(Leonardo DiCaprio) ao lugar,
para investigar o sumiço de
uma paciente.
O onipresente DiCaprio é um
marechal traumatizado pela
morte da mulher (Michelle Williams). Logo que chega ao hospital (ou prisão, como prefere),
recebe avisos sobre os riscos de
acabar encarcerado, vítima de
conspiração. Suas alucinações,
consequência do trauma, são
quase uma provocação para os
médicos; para o espectador,
confundem a realidade e as
imagens que só ele vê.
Scorsese diz que a parceria
de oito anos com DiCaprio
(desde "Gangues de Nova
York", 2002) é a razão de sua
inspiração. "Voltei a me inspirar a fazer filmes de "Gangues"
para cá, e principalmente por
causa dele, por seu talento, sua
curiosidade e coragem."
De outro elemento essencial
à "Ilha do Medo", a chuva (controlada por máquinas no set),
ele não gosta tanto. "Não gosto
de filmar na chuva. Não é medo,
eu não gosto de me molhar. Sou
mimado. Sou mesmo", diz, antes de seguir mais alguns minutos no assunto "condições climáticas e cinema".
A repórter CRISTINA FIBE está hospedada a convite do festival
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