São Paulo, terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

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Cidades paralelas

Exposição no museu Lasar Segall mostra como olhar modernista de Horacio Coppola e Hildegard Rosenthal unificou São Paulo e Buenos Aires

Horacio Coppola/Hildegard Rosenthal
À esquerda, esquina da av. Roque Sáenz Peña com rua Suipacha, em Buenos Aires, em 1936 ; à direita, rua 15 de Novembro, com a praça da Sé ao fundo, em São Paulo, em 1940

SYLVIA COLOMBO
EDITORA DA ILUSTRADA

Uma tem o trânsito caótico, poucas áreas verdes, edifícios de imenso mau gosto arquitetônico e bares e restaurantes voltados para o interior, sem diálogo com o espaço público.
A outra tem um ar europeu que seduz os turistas. É cheia de parques, vias arborizadas e cafés que interagem com a rua.
Se hoje é difícil ver semelhanças entre São Paulo e Buenos Aires, houve um tempo em que ambas não pareciam tão diferentes assim. É isso que tenta mostrar a exposição "Profissão Fotógrafo", que reúne 45 fotografias no museu Lasar Segall a partir do próximo sábado. As imagens foram feitas nos anos 1930 e 1940 pelo argentino Horacio Coppola e pela suíça Hildegard Rosenthal.
Influenciados pelo modernismo e formados na tradição da Bauhaus [escola alemã de design, artes plásticas e arquitetura que funcionou entre 1919 e 1933], ambos realizaram trabalhos que convergem em diversos aspectos.
"Os dois exploraram as cidades a partir de um mesmo olhar, há neles uma preocupação com o geométrico, uma paixão pela forma, pela funcionalidade e pelo fragmento, o diálogo entre sombra e luz, entre outras coisas", explica o diretor do museu e um dos curadores da mostra, Jorge Schwartz.
Horacio Coppola tem hoje 103 anos e vive em Buenos Aires. Antes de ir para a Alemanha, já havia incorporado o modernismo em seu trabalho. No começo dos anos 30, foi estudar fotografia na Bauhaus, até que a escola foi fechada pelo governo nazista, em 1933.
Já Hildegard Rosenthal (1913-1990) nasceu na Suíça, morou alguns anos em Paris e também estudou fotografia na Alemanha, com Paul Wolff, um especialista nas câmeras Leica.
Assim como Coppola, Rosenthal fugiu do nazismo e veio se estabelecer na América Latina. Enquanto ele voltou para Buenos Aires, onde frequentou o grupo de Victoria Ocampo e da revista "Sur", ela veio para São Paulo e passou a trabalhar com fotojornalismo.
Com a exposição, será lançado "Metrópole", livro com cem fotografias de Rosenthal, pelo Instituto Moreira Salles.

São Paulo e Buenos Aires
As fotos de "Profissão Fotógrafo" registram instantâneos de um momento histórico de profundas transformações em São Paulo e em Buenos Aires. Ambas cresciam, acompanhando o processo de industrialização dos dois países. As ruas estão cheias de gente andando ou conversando nas esquinas. As cenas noturnas são iluminadas por letreiros de neon. Os cartazes de comércio chamam a atenção, enquanto bondes e automóveis vão tomando espaços.
É comum ver veículos e pessoas ao mesmo tempo nas vias. Ainda não havia uma separação clara sobre quem deveria transitar pela calçada e quem pelo asfalto. A obsessão por retratar avenidas está nos dois. "Há uma espécie de vertigem. As pessoas estavam surpresas com esse rápido processo de alargamento das cidades", diz Schwartz.
Outro aspecto comum às duas paisagens é a elegância dos transeuntes. Para Schwartz, isso deve-se ao fato de haver então uma definição mais evidente sobre o que era público e privado. "Havia uma roupa para sair à rua, outra para ficar em casa. Não era como hoje, em que se usam havaianas nos dois casos", conclui.
Também impressionava o surgimento da multidão. Uma festa cívica no Obelisco de Buenos Aires e o registro da solenidade de inauguração do Pacaembu evidenciam isso. De modo geral, Coppola e Rosenthal realizaram trabalhos distintos ao longo da carreira. Também Buenos Aires e São Paulo são efetivamente bastante diferentes -embora fossem menos naquela época.
O que o recorte de "Profissão Fotógrafo" permite concluir é que um artista e sua formação podem sugerir analogias impensadas, apontar, unificar ou mesmo criar ilusões a partir de determinadas realidades.


PROFISSÃO FOTÓGRAFO

Onde: museu Lasar Segall (r. Berta, 111, Vila Mariana, São Paulo, tel. 0/xx/ 11/5574-7322)
Quando: a partir de sábado, 20 de fevereiro, até 4 de abril; de terça a sábado, das 14h às 19h; domingos e feriados, das 14h às 18h
Quanto: grátis




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