São Paulo, sexta-feira, 16 de abril de 2004

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Desde que o indie é samba

Jovens de visual roqueiro passam a usar o samba como ponto central de referência de sua música pop

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

A imagem do jovem músico independente -o "indie"- de visual e referencial roqueiro e/ou indie começa a ficar datada. Formam-se mais e mais artistas brasileiros que, antes refratários a qualquer modalidade de música brasileira e ainda apaixonados pelas guitarras do rock, hoje usam o samba como o ponto central de referência de seus trabalhos.
É caso, por exemplo, do artista plástico por formação e músico indie por vocação Romulo Fróes, 33. Sempre pelo selo independente Bizarre, ele estreou no grupo experimental Losango Cáqui; hoje, adota o nome próprio, a carreira solo e os sambas ultramelancólicos do disco "Calado".
Ali cabem sambas de Noel Rosa e Ataulfo Alves, mas sobretudo criações próprias e inéditas, suas e de parceiros como o artista plástico Nuno Ramos, 43, de quem ele é assessor. "O que faço é canção, antes de tudo. Samba é o que mais gosto na vida, então é o que permeia minhas canções", defende.
Diz que seu pai, nascido na Bahia e bancário a vida toda, sempre ouviu música brasileira da bossa nova para trás ("acho que só aceita João Gilberto porque é seu conterrâneo"). Romulo negou o pai e mergulhou no indie rock anos 80 e 90, de The Cure a Damon & Naomi. Agora, faz o caminho de volta. O pai até hoje não lhe contou se gosta de seus sambas.
Experiência mais pop e cruzada é a do grupo paulistano Numismata, formado por cinco rapazes entre 22 e 29 anos. A base instrumental da banda é de guitarras, baixo e bateria, mas o que sai da caixa de som é... samba.
Cartola e Monsueto são homenageados, e Jards Macalé e Skowa participam, mas guitarras aprendidas dos Flaming Lips e até a psicodelia de Vanusa ("Atômico Platônico", 68) cabem na receita de "Brazilians on the Moon", editado no final de 2003 pelo selo Outros Discos. "A gente é uma banda de samba tocando rock. As estruturas harmônicas são de música brasileira, não de rock", condensa o compositor e guitarrista Adalberto Rabelo Filho, 28.
Na confluência Olinda-Rio de Janeiro, há ainda o exemplo do pós-roqueiro China, 24. Ex-líder da banda pernambucana de punk e hardcore Sheik Tosado, China é um dos inauguradores do novo selo carioca Cardume.
"Um Só" deixa para lá o hardcore e faz algo que sua gravadora chama de "samba nervoso", em que cabem vocais tipo bossa nova e releitura de "Samba e Amor" (68), de Chico Buarque.
"Comecei a tocar o que realmente ouvia em casa. Gostava do que fazia com o Sheik, mas quase não ouço rock", afirma. "Como não sabia tocar violão direito, não conseguia fazer o que queria. Ouvia Jorge Ben e fazia hardcore."
Completa China, sobre o trabalho de agora: "Não sei se é samba assim, samba assado, intimismo tropical, samba nervoso... Não sei o que estou fazendo".


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