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GUILHERME WISNIK
Selo verde, cortina de fumaça
A arquitetura sustentável é,
em grande medida, um álibi politicamente correto para
uma era de vazio ideológico
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SUSTENTABILIDADE É o tema da
vez na arquitetura contemporânea. O conceito é um guarda-chuva embaixo do qual cabe muita
coisa: desde casinhas e galpões de
madeira construídos na região alpina da Áustria até os novos arranha-céus de Manhattan, feitos com dupla "pele de vidro", mecanismos
de troca de calor com o terreno, reutilização de água de chuva, sistemas
de circulação de ar por diferença de
pressão etc. Além disso, é também o
principal tema de publicações, seminários e premiações internacionais, somando-se à moda tecnológica precedente dos chamados "edifícios inteligentes".
Não há dúvida de que se trata de
um problema urgente, no contexto
da preocupação crescente com o
consumo de energia, emissão de poluentes na atmosfera e aquecimento
global. Conseqüentemente, as construções passam a ser concebidas como organismos vivos, corpos que
trocam energia com o entorno e que
têm uma vida útil. Vendo em uma linha de longa duração, é como se a
consciência humana estivesse finalmente superando a etapa predadora
de sua evolução, simbolizada por cidades que surgiram a partir do trinômio fábrica, estrada de ferro e mina de carvão. É significativo que nesse deslocamento do mecânico ao
energético a antiga ênfase no "esqueleto" das construções tenha sido
transferida para a sua "pele".
No entanto, apesar de revestir-se
de boas intenções, envoltas em uma
aura de compromisso ético que há
tempos estava distante da agenda
arquitetônica, a "green architecture" é uma indústria que responde a
uma conjuntura precisa: a alta no
preço do petróleo e a enorme demanda de combustível fóssil pela
acelerada urbanização da Ásia, em
um contexto geral de prosperidade
econômica e boom imobiliário. Nesse sentido é que difere do ecologismo dos anos 70, surgido num momento de crise e fascinação por uma
utopia pré-capitalista. Hoje, como
observa o crítico espanhol Luis Fernández-Galiano, "Robinson Crusoé
foi substituído pelo tecnocrata".
Impulsionada pela oscilação econômica, a arquitetura sustentável é,
em grande medida, um álibi politicamente correto para uma era de vazio ideológico, de ausência de qualquer compromisso social coletivo.
Construindo edifícios autenticados
pelo selo moral de "ecologicamente
responsável" e obtendo subvenções
econômicas por isso, as grandes empresas se eximem de discutir a fundo o funcionamento das cidades: a
organização fundiária, o transporte
individual motorizado, a poluição
dos rios e o espalhamento da mancha urbana atraído pela especulação
imobiliária. Fica evidente que, nesse
contexto, o edifício ecológico é apenas um paliativo.
Mas o que há por trás dessa cortina de fumaça? Aparentemente, um
modo de simplesmente manter o
"laissez-faire" capitalista, dando-lhe
um verniz politicamente correto.
Quer dizer: transformar a ecologia
em publicidade voluntarista, do tipo
"faça você mesmo", enquanto se sabe que as grandes decisões futuras
se darão em âmbito macroeconômico, na disputa velada por reservas alternativas de energia, matéria-prima e água.
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