INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Nada pode ser mais subjetivo do que as considerações que fazemos sobre atores. No entanto, quando um ator que não suporto torna-se subitamente suportável e até digno de simpatia, é que alguém o dirige bem.
Esse é o caso de Tyrone Power em "A Marca do Zorro" (Telecine Classic, 1h20), dirigido por Roubem Mamoulian.
Acrescente-se que esse papo de justiceiro mascarado e seus embates com as autoridades espanholas é um tanto antiquado. Ainda assim, o filme flui suavemente, e cada um dos episódios é capaz de reservar alguma surpresa -que vem menos de sua significação do que da maneira como é construída.
Mamoulian foi um cineasta de poucos filmes e em quase todos soube imprimir uma marca de elegância, fluência e firmeza.

MINISSÉRIE

A essência de Balzac em série francesa

ANTONIO ARRUDA
FREE-LANCE PARA A FOLHA

O dinheiro, como o caracterizou o escritor francês Honoré de Balzac (1799-1850) em seu livro "A Prima Bette", é "o único deus moderno no qual se tem fé". Na maioria das histórias do autor, não há redenção possível na sociedade burguesa dos poderosos.
Se não suavizasse, no final do último episódio, essa essência balzaquiana do inescrupuloso, propondo certa possibilidade de "endireitamento moral", a minissérie francesa "Rastignac ou Os Ambiciosos" seria um ótimo exemplo de diálogo entre TV e literatura. Mesmo assim, o desfecho não chega a comprometer a obra.
Os quatro episódios da minissérie serão exibidos amanhã, de uma vez, no Eurochannel. Considerada a versão moderna do romance "O Pai Goriot", a minissérie conta a história de Eugène de Rastignac (Jocelyn Quivrin), jovem criativo e carismático, filho de poderosos, que, movido por uma ambição desmedida, vai a Paris atrás de sucesso e glória.
A relação passional que Rastignac mantém com o idealista porém não menos corruptível Lucien de Rubempré (personagem de "Ilusões Perdidas", outro romance de Balzac), interpretado por Flannan Obe, constitui o eixo da minissérie.
Elo dramático entre os dois personagens, está a advogada Elsa Romieux (Alika del Sol), que não figura em nenhuma obra de Balzac e, talvez por isso, é dona da mais correta personalidade dentre todas que fazem da trama um ajuntamento explosivo de sexo, política, paixões, frustrações...
Aos que conhecem um pouco de Balzac, "Rastignac ou Os Ambiciosos" traz sutis alusões não só a romances do autor, como à sua biografia, e abre possibilidades para pensar como a TV tem se apropriado da literatura hoje. Aos que desconhecem, a chance de conhecer a base decadentista que marca sua produção -ainda que a leitura de seus livros traga imagens muito mais contundentes sobre a depreciação do humano.