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Darlene Glória volta ao cinema como cafetina
Musa de "Toda Nudez Será Castigada" (73) está em longa sobre exploração sexual
"Julgo, absolvo ou condeno os personagens", diz atriz, que fez hiato na carreira ao se tornar cristã; "Tive medo de que não me aceitassem"
SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A TERESÓPOLIS (RJ)
A atriz Darlene Glória fez
história no cinema brasileiro
no papel da prostituta Geni, de
"Toda Nudez Será Castigada"
(1973, Arnaldo Jabor).
"Eu estava no auge", diz, não
sem razão. Darlene tornou-se
uma das mais cobiçadas mulheres brasileiras, aos 27 anos
de idade. "Naquela época, Balzac é que mandava", afirma.
Balzac e a sedução das mulheres na fronteira dos 30 saíram de moda, como constata
Vera, personagem que Darlene
encarna agora, no longa-metragem inédito "Anjos do Sol", de
Rudi Lagemann, que estréia no
mês que vem e a que a Folha
assistiu na semana passada.
Vera é uma cafetina carioca
que atravessa a vida da protagonista Maria (Fernanda Carvalho), garota submetida à
prostituição aos 12 anos de idade por uma rede de tráfico e exploração de mulheres que envolve desde políticos ricos a garimpeiros pés-de-chinelo.
Alerta
Darlene diz que aceitou o papel porque, a partir da leitura
do roteiro, achou que o filme
seria "muito oportuno, um
alerta, uma denúncia".
Quando encontrou no set o
diretor estreante Lagemann, a
atriz teve a impressão de estar
diante de um cineasta ligeiramente intimidado. "É por causa daquela frase infeliz", pensou, voltando no tempo até a
época de "Toda Nudez..." e de
sua declaração de máxima autoconfiança: "Eu dirijo os diretores", dizia Darlene.
Não era totalmente verdade.
"Mas eu adorava chocar, mesmo que, para isso, tivesse que
dizer coisas em que não acreditava", lembra a atriz.
Para provar a Lagemann que
os tempos (também para Darlene Glória) hoje são outros, ela
pediu ao diretor indicações claras do que ele queria.
Lagemann mencionou que
gostaria que Vera mascasse
chicletes. Darlene compreendeu a indicação: "É esculacho o
que ele quer. Mesmo a mulher
mais elegante, quando masca
chicletes, fica vulgar."
E a Vera de Darlene Glória é
toda vulgaridade e esculacho,
numa interpretação em que a
atriz ressalta o caráter da personagem. "Ela é horrorosa".
Diferentemente da maioria
das atrizes, Darlene diz que, hoje, não sofre por suas personagens nem se furta de julgar suas
ações. "Julgo sim. E condeno
ou absolvo, quando for o caso.
Não tenho que entender as razões da Vera, achá-la boazinha.
O problema do ator é transmitir", afirma a atriz.
Interpretar sem se confundir
com o papel é uma característica recente na carreira de Darlene Glória, que fez um parêntese
na vida de atriz quando se tornou evangélica, no fim dos 70.
"Eu tinha vontade de voltar
[a atuar], mas me dava pânico,
medo de que as pessoas não entendessem, não aceitassem.
Naquela época eu ainda queria
agradar a todo mundo", diz.
Recomeço
A volta à cena do cinema é
um entre muitos pontos zero
na vida de Darlene Glória. "Tenho começado minha vida muitas vezes", afirma. Um dos recomeços foi nos EUA, onde
Darlene acumulou as funções
de missionária evangélica e faxineira em casas abastadas.
"Nunca sofri preconceito lá.
Também, eu chegava para trabalhar com meu carrinho Nissan e meu casaco de peles, já
que fazia muito frio", diz.
Enquanto viveu nos Estados
Unidos, de onde voltou "há uns
cinco anos", Darlene diz que a
idéia de retornar ao Brasil "era
o maior pesadelo". No tempo lá,
ela tentou "curar a dor-de-cotovelo" pela separação do marido, um pastor evangélico com
quem ficou casada durante 14
anos, até 1989.
A dor-de-cotovelo permanece. "A separação não estava no
meu vocabulário", diz. Mas a
idéia de voltar ao Brasil tornou-se atraente quando ela recebeu
o convite de outro pastor para
atuar "num filme meio gospel".
O projeto nunca saiu do papel,
mas Darlene veio, ficou e se
aproximou outra vez do cinema
e da TV, mesmo que nem todos
os namoros tenham dado em
casamento.
Conforto
"Não fechei com [a série de
TV] "Mandrake" por dinheiro.
Eles me ofereceram pouco. Tenho meu conforto aqui. Não
preciso sair à toa", diz.
Na casa com vista para o lago
Comary, em Teresópolis, onde
vive, Darlene divide seus dias
entre pintar e contar memórias
ao computador. "Escrevi sete
livros", contabiliza. "Foi uma
compulsão. Uma necessidade
de vomitar um pouco tantos
momentos que vivi."
Quando folheia a própria memória, Darlene Glória tem a
certeza de que "uma atriz muito bela nunca sabe por que um
homem está com ela"; recorda
que, no início da carreira como
atriz, "o difícil era segurar os
homens, principalmente os diretores, porque todo mundo
queria dar uma beliscadinha".
Lembra que tentou ser cantora aos 14 anos, quando trombava com o então também desconhecido Roberto Carlos nos
corredores da rádio ZYL9, em
Cachoeiro do Itapemirim.
Abandonou definitivamente
a idéia anos mais tarde, depois
de ter sido ultrapassada por
Maysa, com quem coincidia no
repertório, e por Maria Bethânia, que despontou justamente
quando Darlene tentava novamente lançar-se como cantora.
"As duas me atrapalharam",
diz, dando risada.
Nas lembranças, descobre
também que uma musa sempre
sucede outra. "Sou dez anos
mais jovem do que a Norma
Bengell. Quando eu estava no
auge, apareceu a Vera Fischer."
Mas acha que, "para quem tem
talento, sempre há trabalho".
De tanto lembrar, Darlene
conclui que "é um ato de graça
esquecer alguém". Refere-se ao
ex-marido, por quem diz ter
chorado todos os dias, de três
seguidos anos. Tempo passado.
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