São Paulo, sexta-feira, 16 de setembro de 2005

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CRÍTICA

Com linguagem televisiva, filme se perde na condução dos atores

PAULO SANTOS LIMA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A família é a grande questão de "Filhas do Vento". Não aquela que esteve em inúmeros filmes nacionais como metáfora política, mas, pelo contrário, a que trava diálogo com um universo mais restrito, o da sala de jantar, no caso, o da teledramaturgia.
O foco do diretor Joel Zito Araújo não é, portanto, o de um Arnaldo Jabor, que em "Tudo Bem" falava sobre a era Geisel através de uma família amalucada. A proximidade está mais para os dramalhões familiares.
Joel Zito Araújo visita as novelas de Manoel Carlos -que juntam ficção a campanhas solidárias- quando recorre ao seu documentário "A Negação do Brasil" para falar sobre o preconceito racial neste "Filhas do Vento". O assunto é tratado em meia dúzia de falas e o que importa no filme é o ajuste de contas familiar.
Não obstante, é com uma linguagem televisiva, naquilo que ela tem de menos cinematográfica, ou seja, apostando nos closes e num estilo de atuação que acredita mais na fala do que no corpo, que Araújo falará sobre as diferenças entre duas irmãs e seu pai, Zé das Bicicletas (Milton Gonçalves). Ele, extremamente conservador, carinhoso com a caçula Ju, mais afinada com a vidinha pacata na pequena Lavras Novas, Minas Gerais, e bem rígido com Cida (Taís Araujo), cujos olhos progressistas miram a carreira de atriz na cidade grande. A tradição e a inovação se digladiando até sua partida para o Rio de Janeiro.
Décadas se passam e Cida (Ruth de Souza) agora é uma reconhecida atriz de TV enquanto Ju (Léa Garcia) permanece no mesmo lar. O reencontro trará à tona rusgas e outras questões, cuja resolução seguirá em cadência igual à de um último capítulo de novela, mas sem definir quem está certo ou errado, o que é bem digno nesta produção.
O filme tenta vôos mais cinematográficos, mas a condução de Joel Zito Araújo demonstra inabilidade na utilização dos recursos. Assim, temos logo no início um registro que parece o do misticismo de "Central do Brasil", de Walter Salles, mais tarde uma referência explícita à morte de Marlon Brando em "O Poderoso Chefão" e uma quase vinheta mostrando a cidadezinha ao fundo em luar acelerado e musicado.
Nesse Frankenstein de estilos, nascem duas questões. A primeira é que Araújo conseguiu o impossível: com exceção de Ruth de Souza, a direção de atores é catastrófica, algo grave para um produto televisivo. E, como cinema, na falta de imagens mais sofisticadas, "Filhas do Vento" está longe da família de um, por assim dizer, Leon Hirszman, de "Eles Não Usam Black-Tie".


Filhas do Vento
 
Direção: Joel Zito Araújo
Produção: Brasil, 2004
Com: Ruth de Souza, Milton Gonçalves, Léa Garcia, Taís Araujo
Quando: a partir de hoje nos cines Espaço Unibanco, Lumière e circuito


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