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CRÍTICA
TV paga faz falsa promessa de distração
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
Noite de insônia, TV ligada.
Quem foi que disse algo do
tipo "há 57 canais, e nada está
passando"? Ah, isso mesmo,
Bruce Springsteen, roqueiro patriota, orgulhoso de ter nascido
nos Estados Unidos e de ser americano a ponto de ser reacionário, mas também um crítico precoce da TV a cabo: "Os caras vieram e instalaram minha TV a cabo/ a gente se acomodou para a
noite, eu e minha garota/ nós ficamos rodando, de cima para
baixo/ 57 canais e nada está passando" (tradução livre da letra de
"57 Channels and Nothing's
On", de 1992).
Poucas coisas são mais frustrantes no reino dos hábitos televisivos do que a falsa promessa
de distração da TV paga. Você se
instala diante da TV, controle remoto na mão, e começa a pular
de um seriado já visto três vezes
para um filme cretino já começado e que estava passando no
mesmo horário três dias atrás e
aterrissa num documentário desinteressante e por aí vai. Nada
para ver, de fato.
Sobretudo nessa época de entressafra de seriados, a maioria
das temporadas 2004/2005 já
acabou, a maioria das novas só
começa em novembro; algumas
das mais aguardadas ainda mais
tarde -"Desperate Housewives" em dezembro; "Lost" em
março de 2006-, e, nesse meio
tempo, sobram apenas as maratonas e as reprises.
Não dá para entender muito
sobre a lógica que rege a grade de
programação dos principais canais que exibem as séries norte-americanas, exceto que a inércia
parece ser a tônica. Quer dizer,
além de adaptar de qualquer jeito
o calendário dos Estados Unidos
-que se concentra entre setembro e maio, ou seja, pouco antes
do outono e pouco depois da primavera, compreendendo outono
e inverno-, que pouco tem a ver
com os hábitos de assistir à televisão do Brasil (justamente nos
meses mais frios daqui, há menos novidades e estréias), parece
haver pouco ou nenhum esforço
de dinamizar a grade.
Por exemplo, por que se insiste
no hábito irritante de reservar
um horário fixo para reprisar um
seriado -agora é "The West
Wing", na Warner; meses atrás a
Sony exibia às vezes três episódios seguidos dos vários "CSI"
no mesmo dia- e se mantém isso por meses a fio?
Se esse abuso da paciência do
espectador acontece em pleno
horário nobre, na alta madrugada é ainda mais chato. Ali é mesmo o lugar do lixão. O que dizer,
por exemplo, da cadeira cativa
que dois seriados que já eram
chatos à época em que passaram
como "Step by Step" ou "Home
Improvement" nas madrugadas
da Warner e da Sony?
Ou então, se o jeito é mesmo
repetir, por que é que não se reserva esse horário dos insones a
alguma espécie de arqueologia
minimamente organizada da
memória das séries? Tudo bem
que parte do hábito da TV se funda na idéia de distração, mas isso
deveria ser privilégio do espectador, não da programação.
@ - biabramo.tv@uol.com.br
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