São Paulo, quinta-feira, 16 de outubro de 2008

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"Um museu deve ser uma coisa viva, e não um depósito"

Álvaro Siza, um dos mais importantes arquitetos em atividade, ganha exposição e lançamento de livros em SP

Português, que projetou Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, fala à Folha sobre construir no Brasil e comenta obra de colegas


MARIO GIOIA
ENVIADO ESPECIAL A PORTO

Um Álvaro Siza mais experimental emerge na exposição "Modern Redux", que é inaugurada hoje para convidados no Instituto Tomie Ohtake. Um livro, editado pela Cosac Naify, acompanha a mostra, que se concentra em 12 projetos recentes do arquiteto português, exibidos por meio de maquetes, fotografias, vídeos e croquis. "Os trabalhos mais recentes de Siza são menos debatidos. Percebemos também que há uma renovada vitalidade neles, com alguns pontos ainda a acrescentar a uma obra já extraordinariamente rica e complexa", disse à Folha o arquiteto português Jorge Figueira, curador da exposição, enquanto definia os últimos detalhes do projeto no escritório de Siza, em uma calma zona residencial na cidade do Porto. Siza, 75, ganhador do mais importante prêmio em sua área, o Priztker, em 1992, guarda boas lembranças de seu único projeto no Brasil, a Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, que ganha também livro da mesma editora. "É a melhor recordação que eu guardo da minha atividade profissional", contou o arquiteto, que falou à Folha sobre construções recentes e outros colegas de atividade, como Jean Nouvel e Richard Rogers, os últimos laureados com o Pritzker. A seguir, as principais declarações do arquiteto na entrevista, que reclama de um caminho verde que a prefeitura de Viana do Castelo, em Portugal, acrescentou a um de seus projetos.

 

A FUNDAÇÃO IBERÊ
O melhor é que já é uma recordação. Já é passado e é, provavelmente, a melhor recordação que eu guardo da minha atividade profissional, porque houve ali uma convergência de interesses, desejos e entusiasmos que não acontecem muitas vezes. Um dos grandes problemas para conseguir qualidade na arquitetura é que o dono da obra, quem paga a obra, é quem manda no arquiteto. Se ele não está particularmente interessado, é muito difícil atingir uma certa qualidade. Se, realmente, há um interesse grande, se há boas condições de trabalho, é mais natural que aconteça a arquitetura. Eu acho que no Iberê Camargo houve isso [o museu foi inaugurado em maio passado].

INFLUÊNCIA DO PINTOR NO MUSEU
O fato de ter conhecido a obra de Iberê Camargo [1914-1994] e tido oportunidade de ver uma parte significativa da coleção constituiu um impulso grande para o projeto do museu. É uma obra de grande qualidade e que cria uma vontade de ligação, às vezes contestada, entre as várias artes. Nesse caso, entre a pintura e a arquitetura. Mas, como museu de arte contemporânea, também dedica-se a exposições temporárias, mantendo o que deve ser o centro de um museu, ser uma coisa viva e não um depósito visitável. Um museu deve ter a capacidade de receber coisas muito diferentes.

MUDANÇAS EM PROJETOS
A Biblioteca de Viana do Castelo é uma plataforma, à beira de rio, um sítio aonde irá muita gente, dentro de uma cidade histórica, mas que não pode ter obstáculos. Talvez tenha sido alterado por sensibilidade a certas críticas da opinião pública. E foi colocado um caminho verde ridículo. Não que eu seja contra o verde, muito pelo contrário. Já fiz muitos espaços verdes nesses longos anos. Agora, em alguns casos, é um corpo estranho, não se justifica, como nessas mudanças feitas.

ROGERS E NOUVEL
O Prêmio Pritzker dá muita visibilidade às obras do arquiteto escolhido. Um prêmio é muito agradável, mas depende de muitíssimas coisas. Eu acho que ninguém tem que ficar vaidosíssimo por ter um prêmio. Os últimos dois [Jean Nouvel, neste ano; Richard Rogers, no ano passado] são grandes arquitetos. O Nouvel tem uma obra vastíssima, infatigável. E o Rogers, o que mais gosto dele é o aeroporto de Barajas, em Madri, grande e com clareza.

O ESPAÇO BRASILEIRO
Para um europeu, trabalhar no Brasil abre caminhos. É uma impressão muito forte. Por exemplo, o Brasil foi decisivo na obra do Le Corbusier. Para um português, vem aquela sensação de espaço infindável, que nós não temos aqui.

O jornalista MARIO GIOIA viajou a convite da organização da mostra



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