São Paulo, sexta, 16 de outubro de 1998

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"O GENERAL"
Boorman transforma ladrão em herói anarquista

da Equipe de Articulistas

Em seus melhores momentos -"Inferno no Pacífico", "Amargo Pesadelo"-, o cinema do inglês John Boorman mostra personagens relativamente comuns confrontados com situações-limite.
Em seu novo filme "O General", opera-se uma inversão: aqui, o protagonista é um homem fora do comum que cria sua própria circunstância e testa seus limites.
Esse protagonista é Martin Cahill (Brendan Gleeson), assaltante verdadeiro morto em 1994, que ganhou uma dimensão legendária nos subúrbios de Dublin (Irlanda) por seu carisma e ousadia.
À margem da luta nacionalista do IRA -mas servindo-se dela sempre que lhe convém-, Cahill monta uma estrutura criminosa que desafia a polícia, travando uma batalha particular contra o inspetor-chefe local (Jon Voight).
Boorman diz que fez de tudo para não apresentar Cahill como um herói romântico. Pode ser. Mas tudo no filme -mesmo, paradoxalmente, o sóbrio preto-e-branco em que foi rodado- configura a história de um homem extraordinário, uma espécie de Robin Hood moderno, que, apesar de sua truculência e oportunismo, segue uma ética pessoal implacável.
Não é propriamente o dinheiro o que move Cahill, mas a vontade de vencer a polícia e manter a ascendência sobre seus súditos.
Depois de assaltar a maior fábrica de jóias de Dublin, Cahill e seus homens roubam quadros de uma coleção particular, expostos na Russborough House.
Quase sempre, seus golpes são fruto de puro engenho, prescindindo da violência. A brutalidade do General, quando emerge, é exercida contra seus próprios cúmplices, que "saíram da linha".
Os truques são simples e geniais. Exemplo: a polícia coloca dois homens para seguir Cahill. Ele sai de carro com um comparsa, os tiras vão atrás. Cahill roda horas por estradas secundárias. A certa altura, desce do carro e o reabastece com um galão trazido no porta-malas. Os policiais, desprevenidos, ficam a pé no meio do nada.
A guerra surda que Cahill empreende contra a lei é, portanto, intelectual. Mas é também moral. Há nele uma pureza que contrasta com as ações da polícia. É a energia do indivíduo contra a corrupção das instituições. Nesse sentido, o filme atualiza o anarquismo "anti-establishment" que havia em certo cinema dos anos 60, aquela década que ocorreu há séculos. (JGC) ²
Filme: O General Produção: Irlanda, 1997 Direção: John Boorman
Com: Brendan Gleeson Quando: hoje, às 18h, na Cinemateca



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