São Paulo, segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Crítica/show/"Beijo Bandido"

Ney mescla gêneros em show minimalista

TONY GOES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A os 68 anos de idade e com a voz límpida como nunca, Ney Matogrosso é mais moderno do que os emos e pittys que infestam a música brasileira. Também é muito mais antigo: suas raízes não estão no tropicalismo nem na bossa nova. Ney é fruto do mesmo pé que deu Nelson Gonçalves e Ângela Maria. Um fruto de casca diferente, sem dúvida, mas, no fundo, de sabor parecido com o dos cantores que ele ouvia no rádio quando criança.
Essa genealogia não é novidade, mas fica ainda mais evidente em "Beijo Bandido", o show que estreou nacionalmente em São Paulo no último fim de semana. Na verdade, Ney já vinha apresentando rascunhos do novo espetáculo desde o final de 2008, quando a turnê de seu trabalho anterior, "Inclassificáveis", ainda nem havia terminado. Foi testando músicas e arranjos até chegar ao formato atual, contido e arrebatador na medida certa.
O repertório é à prova de bala -ou talvez seja Ney quem o faz assim. Ele tem o dom de misturar canções de gêneros e épocas diferentes e torná-las suas, como se os compositores o tivessem em mente.
Apenas "Invento", de Vitor Ramil -onde há o verso que dá nome ao show-, é inédita. "Da Cor do Desejo" já havia sido gravada por seu autor, o alagoano Junior Almeida, mas só agora ganha projeção nacional.
Ney não se faz de rogado ao combiná-la com "Da Cor do Pecado", o clássico de Bororó que gravou anos atrás.
E ainda mistura o pop dos anos 80 ("Nada por Mim", de Herbert Vianna e Paula Toller) com "Segredo", carro-chefe de Dalva de Oliveira, passando por Edu Lobo, Chico Buarque, Zé Ramalho, Astor Piazzola e Roberto Carlos. Os excelentes arranjos acústicos dão unidade e coerência ao projeto.
Até a manjada "Fascinação" ressurge renovada, arrancando aplausos da plateia -formada, em grande parte, por senhoras idosas que não continham o assanhamento. Tudo soa exótico, tudo soa natural.
Ney está sempre escarafunchando coisas novas, ao mesmo tempo em que remexe o fundo do baú. Nesse ponto, se parece com Maria Bethânia, também único páreo para ele no quesito presença em cena.
"Beijo Bandido" é um espetáculo intimista e minimalista. O cenário se resume a algumas projeções no fundo do palco.
Como de costume, a iluminação é primorosa. É um prazer vê-lo de uma poltrona de teatro, em vez das barulhentas casas de shows habituais. Mas talvez ficasse ainda melhor num espaço pequeno, que valorizasse o clima de cabaré. Ney não precisa de mais nada.


BEIJO BANDIDO
Avaliação: ótimo



Texto Anterior: Crítica/exposição/"Vertigem": Dupla cria "cosmética da pobreza"
Próximo Texto: Resumo das novelas
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.