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ARTES PLÁSTICAS
A Anual de Arte chega à 35ª edição; neste ano, não há tendência predominante entre as obras expostas
Faap reúne investigações sobre o urbano
MARCELO COELHO
COLUNISTA DA FOLHA
Stendhal disse que o romance é um espelho passando ao
longo de uma estrada; refletirá
tanto as flores quanto a lama que
encontrar pelo caminho.
A artista plástica Vera Uberti faz
coisa parecida, num vídeo que é
destaque na 35ª Anual de Arte, exposição anual de alunos da Faap.
Ela construiu um cubo com espelhos e jogou-o nas águas do Tietê.
Acontece que o cubo flutua, e vai
refletindo vagarosamente o céu e
a imundície à sua volta. O vídeo
de Vera Uberti registra essa deriva. Os tons de cinza, verde e pardo
do rio poluído ganham uma luminosidade prateada ao se refletirem no espelho. As imagens são
projetadas numa parede. Em outra parede, fazendo ângulo reto
com a primeira, outro vídeo é
projetado, em que outro cubo e
outro rio se refletem.
É difícil identificar uma tendência predominante entre os trabalhos dos estudantes deste ano.
Mas, para além das heterogeneidades de linguagem, é nas obras
de temática urbana que está o
mais interessante da mostra.
Giuliano Montijo armou um
aparelho de fliperama com tábuas
de madeira, pregadores de roupa,
bolas de gude e restos de um fliperama de verdade, num visual favelizado e trágico. Nas xilogravuras de Anna Mazzei Nogueira, retratando um pátio de conjunto
habitacional ou gente empurrando um carro enguiçado, é como se
Oswaldo Goeldi quisesse ressuscitar na periferia.
Papeizinhos com pedido de esmola são pendurados na parede e
ganham moldura dourada na
obra de Roger Bassetto. Com delicadeza, o vídeo de Rita Meireles
mostra fotos banais de São Paulo,
a que a artista acrescenta horizontes azuis e cor-de-rosa com caneta
de hidrocor.
Não é tão imediata a relação de
"Três linhas", belo e premiado
trabalho de Patrícia Pomerantzeff, com o urbano. Trata-se de
uma longa série de fotografias,
que se estica por uma das paredes
do salão. Há fotos de tudo: uma
praia de cabeça para baixo, um
tronco de árvore deitado, bronzeadores numa prateleira de farmácia, a barriga de um cachorro,
garfo e faca cruzados num prato.
Essas imagens têm em comum
o fato de se dividirem em três faixas horizontais, de tamanho mais
ou menos equivalente. Dispostas
em sequência, formam como
uma avenida de cores, homogênea e variável. O que poderia ser
visto como simples -e fascinante- jogo formal não deixa de
lembrar, contudo, a visão do pós-modernista Robert Venturi, defendendo a arquitetura de "beira
de estrada", a "strip" -tira uniforme e bidimensional de edificações que caracteriza Las Vegas.
Estradas e espelhos, portanto.
Verdade que não necessariamente juntos. Mas possíveis indicações de confluência entre artistas
de uma mesma geração.
35ª ANUAL DE ARTE. Faap (r. Alagoas,
903, SP, tel. 0/xx/11/3662-7198). De ter.
a sex., de 10h às 21h. Sáb. e dom., de 13h
às 18h. Até 21/12.
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