São Paulo, sexta-feira, 16 de dezembro de 2005

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"MORO NO BRASIL"

Finlandês investiga raízes musicais do Brasil

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Cinco anos atrás, o cineasta finlandês Mika Kaurismäki percorreu cerca de 4.000 quilômetros pelo país em busca das raízes da música brasileira. Parte do resultado dessa investigação está em "Moro no Brasil", um documentário curioso que revela artistas e manifestações musicais que até a maioria dos brasileiros desconhece.
Ex-baterista, o quarentão Kaurismäki começa o filme provocando sorrisos. Conta que surpreendeu seus amigos da juventude ao trocar um disco da banda de rock Deep Purple por uma exótica compilação de música brasileira. Décadas depois, já vivendo no Rio, onde até abriu um bar, decidiu conhecer "in loco" essa diversidade musical.
Ciente da impossibilidade de reunir tantas manifestações em um único filme, o cineasta centrou sua investigação em Pernambuco, Bahia e Rio. Em cada região, contou com a ajuda de artistas que introduzem ao espectador os ritmos e músicos locais.
Assim, o cantor Silvério Pessoa narra de forma quase proustiana como conheceu os maracatus em sua infância, no interior pernambucano. E a carismática dupla de emboladores Caju (que morreu após a filmagem) e Castanha conta como a miséria os transformou em artistas, nas ruas de Recife.
Em outras cenas é o próprio cineasta que apresenta suas descobertas, como a vibrante percussão do grupo Bagunçaço, formado por moradores das palafitas de Salvador. Ou o improvável balé afro que as meninas do Majê Molê criaram como alternativa de lazer, em uma região pobre de Recife.
Sabe-se que Kaurismäki também filmou alguns medalhões da MPB, como Lenine e Carlinhos Brown, mas decidiu deixá-los de fora, optando por um elenco de artistas pouco ou nada conhecidos no exterior. As exceções são a cantora baiana Margareth Menezes e o cantor carioca Seu Jorge, que na época ainda estava gravando seu primeiro disco.
Assim como não deu bola para o mangue beat pernambucano nem para a axé music baiana, o cineasta também ignorou a bossa nova. No Rio, preferiu focalizar o samba tradicional de Walter Alfaiate ou o samba-funk de Ivo Meirelles.
"Moro no Brasil" não é um retrato musical completo do país, mas seu valor está justamente em mostrar fragmentos preciosos de um Brasil que só alguns de seus moradores conhecem.


Carlos Calado é jornalista e crítico musical, autor de "A Divina Comédia dos Mutantes", entre outros livros.

Moro no Brasil
Sound of Brazil
   
Direção: Mika Kaurismäki
Produção: Alemanha/Brasil/Finlândia, 2002
Com: Seu Jorge, Caju e Castanha, Walter Alfaiate e outros

Quando: a partir de hoje nos cines Morumbi e HSBC Belas Artes


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