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Diretor brilha em parábola trágica sobre a sorte e o acaso da vida
CÁSSIO STARLING CARLOS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A vida é trágica ou cômica? A
pergunta que se faziam os
amigos no bar era respondida em
tom de farsa na história de "Melinda e Melinda", filme anterior
de Woody Allen. Diante da mesma questão, o tenista Chris Wilton, protagonista deste "Ponto Final - Match Point" não vacila
-escolhe a primeira opção.
De fato, o que Allen propõe e
demonstra neste seu último filme,
com uma densidade inesperada, é
que tudo o que parece ser uma escolha, não é. Sorte, acaso e jogo
são algumas das metáforas que
transitam ao longo da narrativa.
Mas ele reitera, sempre voltando à
questão de "Melinda e Melinda",
que, numa partida, para ganhar é
preciso perder e que nem um jogo
de dados abolirá o acaso.
Chris Wilton é um herói romanesco, da linhagem daqueles que
ganharam a eternidade em obras
como "Crime e Castigo" (de Dostoiévski) ou "Uma Tragédia Americana" (de Theodore Dreiser).
Como jogador, Chris é uma criatura mimada pela vitória. Só um
fator essencial o poupa da soberba: ele acredita na sorte.
O personagem vai dar a Allen a
oportunidade de retomar um tema arqueológico da literatura, do
teatro e do cinema -a paixão como força trágica, destruidora das
seguranças racionais, reiterada
aqui com as árias de ópera, que
acentuam a emoção e substituem
a ligeireza do jazz de outros de
seus filmes. Paixão daquela espécie que, no cinema, Truffaut foi
grande especialista, como em "As
Duas Inglesas e o Amor" e ""A
Mulher do Lado", que repercute
intensamente em "Ponto Final".
Com uma ambigüidade certeira, o diretor decide a partida. No
tênis, Chris está em campo seguro, controla as forças, sabe manipulá-las e é tão regulado que pode
desempenhar a função de mestre.
No tênis, ele conhece os irmãos
Tom e Chloe, exemplares de uma
civilização da sociabilidade sem
arestas. Mas é numa mesa de pingue-pongue que seu caminho vai
ser bloqueado pela atriz Nola,
personagem cujas origens são
obscuras e que se aferra a uma ilusão. Numa palavra, instável.
Ambos conjugam um só verbo
(to play, em inglês). A diferença é
que o jogo de Nola a condena ao
fracasso, e Chris, para vencer, se
for preciso, vai até o fim.
Em outro momento, quando a
paixão abre de vez as portas, Allen
antecipa para o espectador a chave do que lhe interessa nesta história. No primeiro beijo sob a
chuva, será a vez de Nola interrogar Chris: "Você não tem culpa?".
Ora, estamos postos a partir daí
no atalho da paixão que conduz
ao crime, mas cuja resolução passará longe das ficções apaziguadoras. Pois o que interessa a Allen
não é a solução de um mistério.
Solucionado ou não, punido ou
não, resta, como uma cicatriz, seu
efeito: a culpa.
Já era assim em "Crimes e Pecados", filme anterior em seu currículo e ao qual "Ponto Final" mais
se assemelha. Em ambos, a ausência física de Allen pode frustrar o
público, que conta com ele para
satisfazer a expectativa cômica,
mas isso permite ao diretor usar
outra força para apertar a corda
no pescoço de seus personagens.
Ponto Final - Match Point
Match Point
Direção: Woody Allen
Produção: Reino Unido/EUA/Luxemburgo, 2005
Com: Jonathan Rhys Meyers, Scarlett Johansson, Emily Mortimer
Quando: a partir de hoje no Espaço Unibanco e circuito
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