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Dramaturgo inglês faz crítica mordaz ao cinema
Mark Ravenhill comenta "Produto", peça que satiriza as produções comerciais
Espetáculo será encenado no Festival de Curitiba; em Nova York, autor acaba de estrear obra que mistura teatro com documentário
GUSTAVO FIORATTI
DA REPORTAGEM LOCAL
O dramaturgo inglês Mark
Ravenhill tem um pé atrás com
o cinema. Já foi convidado para
escrever roteiros de filmes,
mas, diz, ficaria nervoso se tivesse que lidar com tanto dinheiro envolvido em uma só
produção. "Teatro é mais barato", brinca, em entrevista à Folha por telefone, de Nova York,
onde acaba de estrear "A Life in
Three Acts".
Nos dias 21 e 22, o Festival de
Curitiba apresenta um texto do
autor escrito justamente como
uma reflexão sobre a sétima arte, com o título provocativo de
"Produto".
"A Life in Three Acts", a peça
mais recente, foi premiada no
Festival de Edimburgo em
2009. É uma espécie de documentário em cena, com o autor
no palco entrevistando uma
drag ativista gay de Londres
chamada Bette Bourne.
FOLHA - Em algum momento há
inclusão de fatos fictícios nessa peça-documentário?
MARK RAVENHILL - Se considerarmos que nem tudo ali na peça é
verdade porque a nossa memória nos trai o tempo todo, sim.
Mas o texto também está o
mais próximo da verdade que
poderíamos chegar.
FOLHA - O uso da linguagem documental é reflexo de um teatro britânico mais politizado?
RAVENHILL - Eu acho que artistas de teatro, em geral, são engajados. Mas tenho visto mais
coisas sobre aspectos sociais da
vida política no teatro. Acho
que existe hoje um olhar para
assuntos públicos, mais do que
sobre a vida privada. As guerras
no Iraque e no Afeganistão
trouxeram reflexões e uma
produção engajada e política.
FOLHA - Quantas vezes você foi
chamado para fazer cinema e quantas vezes você aceitou?
RAVENHILL - Fui convidado
umas dez vezes, mas nunca
aceitei. Eu realmente amo o
teatro, e filmes levam muito
tempo para serem feitos. A
quantidade de dinheiro envolvido em cinema também me
deixaria nervoso. Então eu prefiro a simplicidade de fazer teatro. Uma mídia barata (risos).
FOLHA - Porque decidiu falar sobre
cinema em "Produto", e qual o significado desse título?
RAVENHILL - Eu acho que muita
gente, no mundo do cinema,
realmente pensa em fazer um
produto para ser vendido. Na
peça, o protagonista está contando uma ideia que teve para
um filme, mas está fazendo isso
de um jeito... Parece estar vendendo sua história como se ela
fosse um produto. Acho que o
título vem desse contexto.
FOLHA - Na peça, a imagem do ataque às Torres Gêmeas também é citada de uma forma comercial...
RAVENHILL - Acho que muita
coisa no cinema representa a
violência de uma forma antiga.
Filmes ruins sempre correm o
risco de fazer a violência parecer sexy e glamourosa, e meu
texto usa a imagem das Torres
Gêmeas para mostrar um extremo disso. A violência no palco, mesmo sendo também falsa, ou uma representação, é
mais chocante, acho.
FOLHA - Que sensação você teve
quando viu a imagem das torres
caindo?
RAVENHILL - Acho que, como
muita gente, senti uma sensação de irrealidade, como num
filme mesmo. Foi muito difícil
perceber que aquilo era de verdade. Isso acontece, acho, porque nós somos rodeados de
imagens, durante o dia inteiro,
da televisão ou de publicidade,
jornais, revistas. Esse excesso
fez com que nos tornássemos
alienados de quem nós somos.
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