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"DOUBLESHOT"
Escritor deveria evitar seguir ritmo de James Bond
AMIR LABAKI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
Raymond Benson é mais pontual que as estações do ano. Desde
1997, todo verão americano marca o lançamento nas livrarias de
mais uma de suas aventuras para
James Bond. O título da vez é
"Doubleshot".
O escritor dá sequência aqui à
trilogia iniciada no ano passado
com "High Time to Kill", em que
007 enfrentava, nas montanhas
gélidas do Himalaia, uma nova
organização internacional do crime -a Union.
Repetindo a estratégia de seus
dois primeiros romances com
Bond ("Zero Minus Ten" e "The
Facts of Death"), Benson envolve
o agente secreto criado por Ian
Fleming em mais uma das derradeiras regiões ainda sob domínio
do antigo império britânico.
Depois de Hong Kong e Chipre,
é a vez de Gibraltar, um encrave
inglês em território espanhol, no
extremo sul da Europa mediterrânea. Ao escolhê-lo para palco das
estripulias de Bond, Benson celebra a memória do criador do personagem.
Durante sua atuação como
agente dos serviços britânicos de
inteligência na Segunda Guerra,
Fleming tinha como uma de suas
funções acompanhar o desenrolar dos acontecimentos exatamente em Gibraltar -uma base
aliada em plena Espanha franquista.
O enredo de "Doubleshot" gira
em torno do aproveitamento pela
Union dos arroubos independentistas de um ex-toureiro milionário, batizado Domingo Espada.
A estrutura do livro, com uma
introdução e três atos, tanto facilita os serviços de futuros roteiristas quanto mimetiza as etapas de
uma tourada ("paseo", "tercio de
varas", "tercio de banderillas" e,
finalmente, "tercio de la muerte").
Como nunca, Benson decalca
histórias anteriores. A dívida
maior é para com "Chantagem
Atômica" e "Moscou contra 007".
James Bond enfrenta um duplo
forjado por cirurgia plástica, o
mesmo artifício usado por um
criminoso de aluguel no primeiro
livro. Um vilão secundário, Espada, eclipsa o arquiinimigo Le Gérant (O Gerente), líder da Union,
por sua vez um sucedâneo da velha Smersh. E por aí vai.
A diferença central é que 007
surge mais frágil do que nunca,
tanto física quanto psicologicamente. "Lembrei-me de uma
grande história em quadrinhos
do Homem-Aranha dos anos 60,
"O Homem-Aranha Enlouquece",
e achei que seria legal fazer Bond
pensar que estava ficando louco",
assumiu Benson numa entrevista.
Nem mesmo este combalido
Bond, atuando por fora de suas
atribuições oficiais, torna menos
previsível o desenvolvimento da
trama. A ação não pára, mas Benson a descreve com um estilo a
um só tempo pobre e redundante.
As raras exceções encontram-se
na descrição de locações exóticas,
sobretudo no Marrocos.
Assim, em "Doubleshot" o Benson romancista "pop" perde para
o potencial guia de viagens e experimentado enciclopedista (é
dele o principal livro de referência
sobre 007, "The James Bond Bedside Companion", relançado em
versão on line no site publishingonline.com). É pena, mas seus
dois romances mais recentes deixam-se ler sem jamais empolgar
ou repetir o frescor e o fôlego dos
dois primeiros.
Benson não deveria se obrigar
ao mesmo ritmo frenético de
Bond. Apenas nos últimos quatro
anos ele dedicou a 007 nada menos que quatro romances, três
contos e duas "novelizações" de
filmes, além de ter lançado também na Internet seu primeiro romance independente do personagem, "Evil Hours".
Não duvide que daqui a exatamente um ano estará desembarcando nas livrarias o encerramento da trilogia da Union. Benson limitou-se a revelar que a aventura
será sediada "na Inglaterra e na
França, especialmente na (região
da) Córsega". Derrotado Le Gérant, será a hora de procurar novos desafios.
Já que o cenário deve ser preferencialmente uma região conflituosa onde a Grã-Bretanha mantém interesses coloniais tardios,
por que não trazer Bond para as
Falklands/Malvinas?
Em 2002 serão completados 20
anos desde o último confronto
-007 no Atlântico Sul: nada mal
para relembrar umas das guerras
mais estúpidas deste final de século. E para dar a Bond mais uma
chance de (re)viver e deixar morrer.
Doubleshot
Autor: Raymond Benson
Editora: G.P. Putnam's Sons
Quanto: US$ 23,95 (258 págs.)
Onde encomendar: www.amazon.com
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