São Paulo, segunda-feira, 17 de julho de 2006

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Hernández alia em sua obra o "cotidiano ao excepcional"

DA REPORTAGEM LOCAL

Montevidéu não é lá uma cidade muito agitada. Seu lugar como uma das capitais literárias da América Latina, entretanto, não pode ser discutido. Basta mencionar a obra de Juan Carlos Onetti (1909-1994), que a recriou ao fundar sua fictícia Santa María, os famosos encontros lítero-musicais em cafés e a atmosfera parada de suas ruas e esquinas, por onde o próprio Jorge Luis Borges vagou e a quem dedicou versos como: "Puerta falsa en el tiempo/ tus calles miran al pasado más leve" (porta falsa no tempo/ suas ruas olham para o passado mais leve).
Felisberto Hernández foi um de seus personagens. Pianista de pequenas platéias, apresentava-se em bares e no interior do país -às vezes, tocava em Buenos Aires. Comilão e introvertido, há poucas dicas sobre o que ele realmente leu. É mais provável que tenha aprendido mesmo com as conversas literárias pelas noites. "O Cavalo Perdido", primeiro conto dessa coletânea lançada pela editora Cosacnaify, é um bom exemplo do tipo de universo em que o escritor uruguaio gostava de transitar. Um garoto é levado às aulas de piano pela mãe ou pela avó.
Na sala da casa da professora, observa os móveis, descreve intensamente o ambiente e os objetos da jovem mulher, a ponto de erotizar cada gesto e cada detalhe do lugar e das sensações que lhe causam a presença de todas essas mulheres. A narrativa em primeira pessoa percorre tempos sobrepostos das lembranças do menino, num texto de clara influência proustiana. O ilustre fã Julio Cortázar explica que a chave para entender Hernández está na maneira como ele introduz o estranhamento a partir do corriqueiro, aliando "o cotidiano ao excepcional". (SC)


O CAVALO PERDIDO E OUTRAS HISTÓRIAS
Autor: Felisberto Hernández
Tradução: Davi Arrigucci Jr.
Editora: Cosacnaify
Quanto: R$ 45 (227 págs.)


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