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"O "Dragão" te dá um soco na cara"
Martin Scorsese diz que filmes de Glauber podem ajudar jovens atores a não se renderem à indústria hollywoodiana
Diretor de "O Aviador" diz
que cineasta brasileiro é
eterno e que a energia de
seus filmes deve sobreviver
às mudanças no cinema
ESPECIAL PARA A FOLHA
Leia a seguir a continuação
do depoimento do cineasta
americano Martin Scorsese.
(JOEL PIZZINI)
RESTAURAÇÃO
Os filmes de Glauber Rocha
afetaram politicamente outros
filmes. Ele é eterno. Por isso é
necessária a restauração de sua
obra, para permitir que as novas gerações o conheçam, não
somente no Brasil, mas em todo o mundo.
O "Dragão" continua novo,
com todo o frescor. Ele não leva
a grandes bilheterias, mas te dá
um soco na cara, você vê, ergue-se e abre seus olhos. É disso que
precisamos hoje em dia, mais
do que nunca.
PRISÃO
Entre os motivos que me levaram a mostrar o "Dragão" aos
atores e diretores de fotografia
com quem trabalhei ao longo
dos anos, está o de saber que o
filme pode nos libertar de um
tipo de prisão imposto pelo
"star system".
Hoje há vários jovens atores
maravilhosos que são destruídos pelo sistema. Eles surgem
de filmes independentes, nos
quais têm performances maravilhosas. Aí são colocados em
um grande filme de Hollywood
sobre um personagem de quadrinhos. O filme vai mal, e eles
acabam ficando sem trabalho
por alguns anos.
Ao final, o ator acaba aceitando esse estado de coisas. E isso
se transforma numa espécie de
monstro que vai corroendo a
indústria. Um cinema como o
de Glauber precisa ser mostrado aos atores que tenham o desejo de fazer algo mais do que se
tornar parte desse sistema.
NEO-NEO-REALISMO
Quando tinha cinco anos, vi
filmes neo-realistas que ficaram comigo por anos, e eu acho
que é bom devolver isso aos jovens. Eu adoraria vê-los assistindo a esses filmes em DVD. É
melhor do que nada, porque
durante anos você não conseguia vê-los nem nos cinemas.
Essa é uma das razões pelas
quais produzi cópias dos filmes
de Glauber para mostrá-los em
festivais como o de Nova York.
Vê-los na tela grande -devo
dizer, eles são poderosos na tela
na grande-, ou mesmo na televisão ou até em DVD, vale muitíssimo a pena.
A energia dos filmes de Glauber e sua beleza descompromissada devem sobreviver a esses novos meios. Muito da história do cinema eu aprendi
através da televisão, daquela televisão em preto-e-branco e
com intervalos comerciais, na
qual passavam tanto filmes
hollywoodianos, como britânicos e italianos.
POESIA E POLÍTICA
Sou uma pessoa que veio de
um tipo de classe operária apolítica. Meu pai era um funcionário da Secretaria de Jardins
de Nova York, por volta dos
anos 30 e 40. Era um cenário
muito conservador.
No início dos anos 60, comecei a tomar consciência das diferentes formas de pensar que
existiam e do pensamento político. Tinha provavelmente 16
ou 18 anos. De certa forma,
sempre respondi à poesia e
creio que, sobretudo, a partir
dos filmes de Glauber.
A poesia de seus filmes é
eterna. É sobre o ser, sobre a
humanidade, não apenas sobre
um sistema político ou contra
um sistema político. Ela vai
além disso e, portanto, sempre
será algo novo. Penso que os jovens de hoje poderiam se beneficiar ao ver esses filmes.
NA INTERNET - Leia a íntegra da entrevista de Martin Scorsese
www.folha.com.br/062271
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