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Crítica
Em "Príncipe", a cidade cresce erroneamente
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
É incrível a solidão de Gustavo em "O Príncipe" (Canal
Brasil, 18h30; não recomendado para menores de 14 anos).
Voltando da Europa, onde viveu por 20 anos, ele não se reconhece em sua cidade, que
mudou inteiramente.
Em São Paulo, ele viverá alguns reencontros, não apenas
com a cidade, mas com amigos.
Os lugares, no entanto, são fundamentais. É na praça D. José
Gaspar que um amigo (Otávio
Augusto) recita trechos de "A
Divina Comédia" em altos brados. Essa já foi "a praça da Biblioteca", da Galeria Metrópole, do Paribar. Agora é um buraco ocupado por moradores
de rua. As mudanças de São
Paulo induzem à solidão. O
reencontro com a antiga amada é, como de ofício, a constatação do desencontro.
E seu bairro, a bucólica Vila
Madalena, virou o bairro dos
bares, do trânsito e da barulheira noturna.
Esses 20 anos de distância
mostram onde o filme se constrói: sobre um hiato, sobre uma
brecha na qual o tempo se perde, como se a cidade ao se construir executasse um percurso
errático, um labirinto em que
não existe memória possível,
onde as experiências se perdem como se fossem produto
da imaginação.
Para combater esse filme
cheio de virtudes, valia, quando
estava em cartaz, usar qualquer
argumento. Agora, passado o
tempo, talvez ele possa ser visto sem a paixão destrutiva que
tanto se usa para policiar nossos bons filmes.
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