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"Indústria do medo acua São Paulo"
Avaliação é do espanhol Josep Maria Montaner, um dos principais críticos de arquitetura do mundo, que faz palestra hoje na Bienal
Catalão, que lança "Arquitetura e Crítica" em português, elogia nomes brasileiros e cidades como Curitiba e Porto Alegre
MARIO GIOIA
DA REPORTAGEM LOCAL
A cidade de São Paulo, assim
como outros centros urbanos
latino-americanos, está acuada
por uma "indústria do medo",
que a faz se fechar em condomínios e abandonar as áreas
centrais.
Ao mesmo tempo, São Paulo
gerou projetos arquitetônicos
relevantes, como o Sesc Pompéia, de Lina Bo Bardi, e abriga
nomes importantes da área, como o premiado arquiteto Paulo
Mendes da Rocha.
Essa avaliação foi feita pelo
espanhol Josep Maria Montaner, 53, um dos principais críticos de arquitetura do mundo,
que ministra palestra hoje, às
18h30, na 7ª Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo. Montaner também ganha
edição em português de seu livro "Arquitetura e Crítica" (ed.
Gustavo Gili, R$ 45,24, 160
págs.). Professor da Escola de
Arquitetura de Barcelona, onde
dirige o Laboratório de Residência do Século 21, o catalão
considera "muito acertado" o
tema da Bienal, "O Público e o
Privado", e deve abordá-lo em
sua conferência, com mediação
do arquiteto Paulo Sophia.
Leia, a seguir, trechos da entrevista à Folha.
A ARQUITETURA BRASILEIRA
O Brasil se destaca por sua
arquitetura moderna, mas por
ser ela uma arquitetura que
soube se adaptar ao contexto e
não se contrapor ao patrimônio, algo elaborado por Lucio
Costa [1902-1998, um dos criadores de Brasília], defensor
tanto da arquitetura colonial
como da arquitetura moderna.
A arte e a arquitetura brasileiras se desenvolveram conjugando a vanguarda e a tradição.
Há muitos arquitetos que se
destacam no panorama internacional. Além de Oscar Niemeyer e Lucio Costa, são valorizados especialmente na Europa Lina Bo Bardi [1914-1992]
e Paulo Mendes da Rocha. Mas
a modernidade brasileira, ao
ser contextual, não sentiu falta
de uma revisão tão forte das
propostas do movimento moderno como em outros países,
predominando uma continuidade que se reflete na obra de
Mendes da Rocha -tão influenciado por Vilanova Artigas [1915-1985, um dos principais nomes da arquitetura brutalista] e Niemeyer-, que agora
é mestre de uma geração representada pelo MMBB Arquitetos [escritório paulistano].
OS MODELOS BRASILEIROS
Visitei Curitiba e me impressionou sua gestão de mais de 20
anos procurando uma cidade
humana e sustentável, com um
especial cuidado com os parques, o espaço público e o centro histórico. Tudo isso foi conseguido com a chave do transporte público adequado à cidade. É um modelo que cito em
conferências, livros e artigos.
No Brasil, têm sido gerados outros bons modelos urbanos,
claramente diferentes, mas que
estão além da beleza da paisagem do Rio. São emblemáticas
a cidade moderna de Brasília e
o modelo participativo de Porto Alegre. Esta é uma cidade
que vem melhorando paulatinamente, desde seu centro histórico e seu porto até a nova
Fundação Iberê Camargo [projeto do português Álvaro Siza,
que será inaugurado no ano
que vem], passando pelo Gasômetro e por toda a margem verde do rio [Guaíba].
O PÚBLICO E O PRIVADO
Considero muito acertado o
tema da Bienal de Arquitetura
de São Paulo. Estamos em um
mundo onde lamentavelmente
as fronteiras crescem. Nesse
sentido, é emblemática a proliferação de bairros fechados e
condomínios, especialmente
em São Paulo, tal como ocorre
em outras cidades latino-americanas, como Buenos Aires.
Toda uma indústria do medo
fomentou essa rejeição do público na cidade e tem levado a
esse perigo, que é o dos centros
históricos serem abandonados
e se degradar.
Se o público desaparece, destrói-se a cidade, que é a única
possibilidade de o ser humano
sobreviver na atualidade. A
evolução das cidades deveria se
basear em uma equilibrada e
enriquecedora relação entre o
público -que deve evoluir e
atuar com mais energia- e o
privado -que também tem
mudado, mediante as relações
virtuais, os novos modelos familiares, o trabalho em casa, a
miniaturização dos utensílios
cotidianos.
A CRÍTICA DE ARQUITETURA HOJE
A crítica de arquitetura tem
hoje mais sentido que nunca,
em um mundo fragmentado e
complexo. Por isso, é cada vez
mais difícil sua prática. A chave
é ajustar a crítica às mudanças
sociais, tentando compreender
tudo o que implica a globalização, a expansão dos meios de
comunicação, os fortes movimentos migratórios, os agudos
problemas ecológicos etc. Com
isso, são necessárias novas teorias de arquitetura. Devemos
desconstruir e superar dicotomias totalmente condicionantes e falsas como abstrato e figurativo, tradicional e inovador, entre outras.
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