São Paulo, quarta, 18 de fevereiro de 1998

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CINEMA
Terceiro longa-metragem dirigido por Quentin Tarantino foi recebido sem euforia, ontem, no festival alemão
"Jackie Brown" não empolga Berlim

AMIR LABAKI
enviado especial a Berlim

Quentin Tarantino fez bem em cancelar sua vinda ao Festival de Berlim. Seu terceiro longa-metragem, "Jackie Brown", lotou ontem salas, mas foi recebido sem euforia. Berlim repete o Oscar. Mais uma volta por cima é cancelada.
Reconheça-se, de saída, que "Jackie Brown" é o menos impactante dos trabalhos de Tarantino. Não se trata propriamente de um filme ruim, mas sim de uma obra sem surpresas.
Tarantino engana-se redondamente ao afirmar que "Jackie Brown" nada tem a ver com "Pulp Fiction", que nada tem a ver com "Cães de Aluguel".
Seu novo filme é a síntese evidente dos dois anteriores. A trama, extraída do romance "Ponche de Rum", de Elmore Leonard, parece soltar a fauna de "Pulp Fiction" em outra história de golpes emaranhados, como em "Cães de Aluguel".
Uma aeromoça (Pam Grier, rainha do cinema negro dos anos 70) traz ilegalmente dinheiro do México para um traficante de armas (Samuel L. Jackson).
Descoberta pela polícia, busca um jeito de fingir colaborar, escapar da cadeia e ainda levar um troco. Para tanto, alia-se ao mesmo advogado chave-de-cadeia (o veterano Robert Forster, indicado ao Oscar) que serve ao chefão.
Três coadjuvantes de luxo gravitam em torno do trio principal. Robert De Niro faz um lacônico ex-presidiário que ajuda Jackson. Bridget Fonda é a "bimbo" do patrão. Por fim, Michael Keaton reafirma que pode ser ator quando quer, no papel de um hilário policial.
Em "Jackie Brown", pela primeira vez, Tarantino ousa ir além de tipos e apostar na construção de personagens. Os diálogos não mais se restringem à troca de frases de efeito. A ação interioriza-se, o ritmo ralenta-se.
Se o Tarantino-roteirista progrediu numa ponta, regrediu em outra. "Jackie" não tem a complexidade estrutural de "Pulp Fiction". Pior: a história desenvolve-se de forma linear até o terço final, quando o grande golpe de Jackie é recomposto por um esquema de flash-backs à moda "Pulp Fiction".
Jazz e promiscuidade
Dois outros filmes apenas cumpriram tabela na competição. "Fang Lang" (Doce Decadência), de Lin Cheng-sheng, mistura jazz, tédio e incesto no retrato contemporâneo de um jovem sem rumo.
Já "Jeanne et le Garçon Formidable" (Jeanne e o Garoto Formidável), de Olivier Ducastel e Jacques Martineau, levou a disputa ao fundo do poço. É um patético musical engajado sobre os perigos da vida promíscua, espécie de Jacques Demy ("Os Guarda-Chuvas do Amor") para os tempos da Aids.



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