São Paulo, sexta-feira, 18 de março de 2005

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"O CASAMENTO DE ROMEU E JULIETA"

Esquematismo sabota vitalidade

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

O romance entre um corintiano e uma palmeirense, provenientes de famílias arraigadamente fanáticas por seus clubes, poderia suscitar uma comédia de costumes das boas -e há momentos em "O Casamento de Romeu e Julieta" que deixam entrever essa possibilidade.
Mas Bruno Barreto preferiu a comédia romântica, que é mais a sua praia. Uma praia segura e sem ondas, onde cada banhista recebe uma bóia, mesmo que a água só lhe chegue aos joelhos. Todo cuidado é pouco quando o objetivo é alcançar uma grande bilheteria.
O título já diz tudo: o freguês conhece esse amor impossível há 410 anos, mas, para que ninguém se afaste do filme por temor ao desfecho trágico da peça de William Shakespeare, os produtores se apressam em dizer que aqui o final será adequadamente feliz.
A opção dos Barreto levou-os a eliminar quase tudo o que pudesse haver de ambigüidade na história e nos personagens, reduzindo tudo a um esquematismo de novela das sete. Um exemplo: ao pai de Julieta, o palestrino doente Baragatti (Luiz Gustavo), corresponde simetricamente a avó de Romeu, igualmente ensandecida pelo seu Timão -ambos intolerantes como suas matrizes, os Capuleto e os Montecchio.
Até aí tudo bem: toda comédia romântica precisa de um certo grau de simplificação dramática, de uma certa quantidade de estereótipos, para pôr em funcionamento seu jogo.
O problema é que Barreto não deixa espaço para o espectador nadar por conta própria: vai logo entregando as bóias.
Esse zelo excessivo produz cenas constrangedoras como a de Romeu (Marco Ricca), um oftalmologista, conversando no carro com uma imagem de são Jorge, para que todos fiquem sabendo, sem nenhuma margem de dúvida, o que ele sente por Julieta (Luana Piovani).
Dito assim, parece que não há vida no filme, mas há. As cenas em estádios são belas e vibrantes, das melhores que nosso cinema já realizou. E a seqüência da viagem de Romeu a Tóquio, travestido de palmeirense, para assistir à final do Mundial interclubes, é de grande comédia.
À parte isso, Luiz Gustavo constrói um Baragatti irresistível, pleno de verdade, superando com seu talento e sua vitalidade o caráter unidimensional do personagem. Com Renato Consorte, notável no papel de um craque do passado, ele forma uma dupla que parece saída de um filme de Ugo Giorgetti -indicando o que poderia ser a tal comédia de costumes potencialmente contida no argumento do filme.


O Casamento de Romeu e Julieta
  
Direção: Bruno Barreto
Produção: Brasil, 2004
Com: Luana Piovani, Marco Ricca
Quando: a partir de hoje nos cines Bristol, Eldorado, Interlagos e circuito


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