São Paulo, domingo, 18 de março de 2007

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Mônica Bergamo

@ - bergamo@folhasp.com.br

Engraçado, agressivo ou malandro na TV e no cinema, Lázaro Ramos, estrela do filme "Ó Paí, Ó", que estréia no dia 30, cultiva a imagem de sério, manso e correto na "vida real"

João Wainer/Folha Imagem
O ator Lázaro Ramos, nos arredores da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro; "A Bahia é uma tatuagem, mas o Rio me acolheu muito bem"


Foguinho brando

"Venha cá ver uma coisa", convida o ator Lázaro Ramos, debruçado sobre o parapeito de um trio elétrico que acaba de dar a arrancada na concentração do circuito Barra-Ondina, no domingo de Carnaval, em Salvador.

 

"Tá" vendo aquela senhora ali?", diz ele, apontando para uma mulher negra, cabelos grisalhos, aparentes 60 anos, roupas coloridas, encostada em um muro. "É uma pessoa simples que tem uma nobreza que não dá para explicar de onde vem. Veja como ela observa tudo, como ela é parte da festa, como ela não está à margem de nada. Eu admiro essa nobreza do povo baiano, mesmo com tantas dificuldades na vida."
 

O trio onde está Lázaro -e também cantores como Caetano Veloso, Davi Moraes e Zezé di Camargo- divulgará o filme "Ó Paí, Ó", de Monique Gardenberg, que tem pré-estréia marcada para amanhã, 19, em SP, e estréia em circuito nacional no dia 30 -ele também estará, em breve, em "Saneamento Básico", que tem direção de Jorge Furtado. A coluna acompanhou Lázaro no Carnaval e também, dias depois, no Rio de Janeiro.
 

O longa narra um dia de Carnaval a partir da vida dos moradores de um cortiço, que tem a água cortada pela dona do prédio, uma evangélica irritada com a folia. Nas pesquisas sobre o filme feitas pelo sociólogo Antonio Lavareda, do Ipespe, Lázaro Ramos surge como figura unânime entre o público.
 

A atuação do ator, que aparece nu no filme, teve 0% de rejeição -94% do público o acharam "ótimo"; 6% o avaliaram como "bom". Outro astro, o colega Wagner Moura, que interpreta um traficante, foi "ótimo" para 54%; "bom" para 23%, "regular" para 13%; ruim para 8%; "péssimo" para 3%.
 

Aos 28 anos, estrela da TV Globo, morador do Leblon, casado com a atriz Thaís Araújo, Lázaro diz que não subiu no salto alto. "Quanto mais o ator é o que é, melhor ator consegue ser, porque só assim se relaciona com o mundo. Eu sou o que eu sou. Não quero que o ego me impeça de ver o outro."
 

Aclamado aos gritos de "eu te amo!" e "gostoso!" pela multidão, Lázaro foi obrigado a andar com seguranças em Salvador. "Eu, por mim, não andaria com segurança nunca. Só faço porque a produção manda. O povo não ia me atacar, não iria acontecer nada de ruim", diz, no carro, a caminho do hotel cinco estrelas à beira-mar.
 

Mas quem, afinal, é Lázaro Ramos? O rapaz educado com jornalistas e fãs diz que adora comida baiana e tailandesa, mas a pimenta pára por aí. Ele é cuidadoso nos comentários, não economiza em pausas, e se esquiva de polêmicas. Nunca experimentou drogas. "Já sou muito doido." Doido por quê? "No sentido de agitado."
 

Evita álcool. Mas não é abstêmio. "Só bebo ocasionalmente". Torceu pela vitória de Jacques Wagner ao governo da Bahia. Mas não fala mal de ACM. "Olha, vou responder assim: a transição entre governos é importante", diz. "Me parece que o ACM fez muito pelo turismo. Mas não sei até que ponto o pensar era livre. Não sei se as opiniões poderiam ser dadas tão abertamente."
 

Fala bem de Sérgio Cabral, governador do Rio. "Observo uma boa intenção". Lázaro se diz "mais ligado às esquerdas". "Acompanho o noticiário e, sem dúvida, sou muito mais o [presidente venezuelano Hugo] Chávez do que o [presidente dos EUA George] Bush." E dos também esquerdistas Evo Morales, da Bolívia, e Rafael Corrêa, do Equador, o que ele pensa? "Ih... Bolívia, Equador, aí você já complicou demais."
 

Lázaro é cuidadoso também ao citar seus trabalhos. Sobre seu segundo filme (ele já fez 15), "Cinderela Baiana", estrelado pela dançarina Carla Perez e fracasso de público e crítica, diz apenas: "Não tive muito contato nas filmagens, nem lembro direito." Sobre fenômenos de massa da axé music, como a banda É o Tchan: "Tiveram seu papel naquele determinado momento." Se fosse convidado, trocaria a TV Globo pela TV Record? "Não posso responder porque nunca fui convidado." Mas iria? "Olha... [longa pausa] Digamos que eu desejo realizar projetos meus, não só como ator. Tenho idéia de sitcom, de programas de entrevista, de várias coisas... Então não digo que eu não iria."
Lázaro diz que, quando trabalhava como técnico em patologia clínica antes de ser ator -"eu ficava analisando fezes e urina. Era um ótimo técnico!"-, não sonhava com o sucesso que tem hoje. "Mas é muito bom receber os convites que recebo." E recusa o papel de escravizado pela própria fama, ao negar, por exemplo, que tenha se casado em segredo com Thaís Araújo. "Eu só não mandei o "release" [texto de divulgação] do casamento para a imprensa. Mas não escondi nada de ninguém. Foi um casamento normal." E, algo ríspido: "Mas o que é isso? Essa entrevista é para a revista "Caras'?"
 

Depois que estrelou a novela "Cobras e Lagartos", Lázaro passou a fazer o maior sucesso com a garotada. Na lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio, crianças, de bicicleta, acenam para o ator. "É ele mesmo, filho, o Foguinho [personagem do ator na novela]", explica um pai.
 

"A TV é uma grande boca. Só fala, fala, fala. A pessoa se torna uma orelha gigante", analisa. "O ator é uma coisa próxima e distante", continua. "Ô, Martinho da Vila!", grita um morador de rua. "Outro dia, uma criança agarrou em mim e ficou grudada. Levantou minha camisa e contou minhas costelas."
 

Lázaro não tem assessor de imprensa. Não tem motorista. Não tem secretária. Faz ele mesmo a compra do supermercado: salsa, hortelã, tomate, coloral, ovo, cebola, para um almoço na casa de amigos. O gerente do supermercado oferece a ele um caixa nos fundos para evitar o assédio dos paparazzi. Lázaro, o correto, recusa a oferta. Entra na fila. Paga as contas com cartão de crédito: R$ 14.


DANIEL BERGAMASCO (Reportagem)

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