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"Príncipe do samba" completa 90 anos
"Maravilhoso", segundo João Gilberto, cantor Roberto Silva coleciona admiradores, como Paulinho da Viola e Caetano Veloso
Pouco conhecido pelo grande público, artista alia
o romantismo de Orlando Silva ao canto sincopado
de Cyro Monteiro
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Foi numa balbuciante, mas
não menos surpreendente, entrevista a Amaury Jr., em 1990,
que João Gilberto listou Roberto Silva entre seus cantores
preferidos e o classificou de
"maravilhoso". O nome provocou estupefação não só no telecolunista social, mas também
nas editorias de cultura dos jornais, que correram para saber
quem era o "desconhecido".
Afora aquelas e algumas outras reportagens de ocasião,
pouca coisa mudou até hoje.
Mas é quase impossível encontrar neste homem, que completou 90 anos no último dia 9, palavras de ressentimento. "Tenho muito orgulho da minha
carreira. Deu tudo certo", diz.
Até o momento, sabe-se apenas de um programa da série
"MPBambas", do crítico Tárik
de Souza, que o Canal Brasil
exibirá no dia 29. Shows eventuais, como em Santos, dia 27, e
em São Paulo, em junho, não
dependem de datas redondas,
pois nunca deixou de fazê-los.
Em vez de queixas, prefere
orgulhar-se da admiração de
Paulinho da Viola, Caetano Veloso, Zeca Pagodinho ("Roberto Silva é um grande intérprete,
elegante. Em um aniversário da
minha mãe, dei de presente um
show dele") e dos jovens sambistas. Mesmo tendo recebido
nos anos 40 a alcunha de "o
príncipe do samba", cantou todos os gêneros.
Roberto é daqueles casos raros de filiação simultânea à linha do canto impecável e romântico de Orlando Silva e à do
canto sincopado de Cyro Monteiro. Foi nesta que se destacou
mais, sendo um dos principais
intérpretes de Geraldo Pereira
e Wilson Batista.
Fruto de outro tempo, cantou e canta Normélias, Emílias,
Amélias e outras mulheres de
verdade, que priorizavam lavar
e cozinhar. E brilhou no rádio
com histórias típicas de periódicos populares, como "Jornal
da Morte" (Miguel Gustavo),
censurada por sua letra em
1961 ("Tresloucada, seminua/
Jogou-se do oitavo andar/ Porque o noivo não comprava/
Maconha pra ela fumar") e hoje
no repertório da Nação Zumbi.
"Roberto Silva foi muito importante na minha infância, antes mesmo de eu conhecê-lo",
diz Paulinho da Viola. "Amigos
se reuniam na casa de papai [o
violonista César Faria] e cantavam Sylvio [Caldas], Cyro e Roberto. Eu adorava."
De uns anos para cá, Paulinho tem sido obrigado a corrigir os que o chamam de "príncipe". "Príncipe é Roberto Silva.
Eu sou só um vassalo", diz.
Saúde e mulheres
Roberto faz uma hora de
exercícios por dia. "Ginástica
de velhinho", como diz, que lhe
mantêm tórax e andar eretos.
Dá pulos no palco, só usa óculos
para escrever, parou de fumar
há 40 anos e deixou para trás os
drinques pesados.
"Estou doido para fazer 90.
Bem do jeito que eu estou, qual
o problema?", diz ele, chamado
por um amigo de "inoxidável".
O vozeirão continua firme,
tendo baixado meio tom em
apenas três músicas. "Ainda
não peço para o público dar o
agudo por mim", brinca.
O resultado de tamanha saúde é o alvoroço feminino. Em
Recife, uma bilheteira mandou
um convite para ele cantar em
seu quarto. Há as que põem bilhetinhos no seu bolso. Outras
ligam chorando tarde da noite.
"Terceira idade é fogo. Dão
em cima, mas ela não deixa",
constata. "Ela" é Syone Costa,
um tanto mais nova do que ele,
advogada que se tornou sua
empresária e mulher há 16
anos. Roberto ficara viúvo e pôde reencontrar a moça que conhecera há cinco décadas e em
quem dera em cima sem revelar o detalhe de já ser casado.
"Gosto muito da vida. Mas, se
ela morrer, eu acabo", anuncia,
apontando para Syone, o patriarca de uma família de sete
filhos (quatro feitos dentro do
casamento, três fora, "vida de
artista"), 22 netos e 12 bisnetos.
FOLHA ONLINE
Ouça trechos de músicas
de Roberto Silva
www.folha.com.br/1010510
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