São Paulo, terça-feira, 18 de maio de 2004

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ARTES

"Tesouros de Etchmiadzin", na Pinacoteca, torna-se ponto de atração para 50 mil descendentes que vivem em São Paulo

Comunidade armênia peregrina até exposição

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Foi com o filme "Ararat" (2002) que o diretor canadense Atom Egoyan tratou de suas raízes armênias. A produção, sobre o genocídio de 1,5 milhão de armênios pelo Exército turco, entre 1915 e 1922, é exibida, hoje, na Pinacoteca do Estado, como evento paralelo à mostra "Tesouros de Etchmiadzin", que trata justamente da cultura armênia.
Não por acaso, esse percurso em busca das origens tem sido uma constante entre os visitantes da exposição.
"Vim porque meu coração mandou", afirmou, na última quinta-feira, Elizabeth Simonian, paulistana filha de armênios. Desde que foi inaugurada, no último dia 7, a mostra tornou-se um centro de peregrinação de armênios e seus descendentes, como Simonian: "Estou muito emocionada. Muito do que vejo aqui aprendi com meus pais, que chegaram em São Paulo, após o genocídio. Raízes são raízes".
Apesar de não contar com monitores, graças à visitação de descendentes de armênios, até os seguranças da exposição andam bem informados sobre o conteúdo da mostra. "Há muitas pessoas que nos contam o significado do que está exposto aqui, alguns até lêem os textos em armênio escritos em algumas peças", conta Marcelo Luiz Quatrini, um dos seguranças de "Tesouros de Etchmiadzin".
Quem se aproxima da réplica da lança que teria ferido Cristo na cruz pode ouvir de Quatrini que "a original se encontra na Armênia, de onde nunca sai, e que a peça só é exposta a cada 15 anos".
"Um dos papéis do museu é apresentar culturas diversas, distantes da nossa. Fico fascinado que, em tempos de globalização, ainda haja culturas a serem descobertas, tão singulares e específicas como a armênia", diz o diretor da Pinacoteca, Marcelo Araújo. Para ele, um dos trunfos da exposição é retratar a cultura de um grupo que vive próximo à Pinacoteca: "Essa é uma região histórica onde se instalou a comunidade armênia, suas igrejas estão por aqui, a proximidade é imediata".
Religião é, aliás, o tema central da exposição, que apresenta um conjunto de objetos litúrgicos do acervo do Museu da Santa Sé de Etchmiadzin. Sendo assim, torna-se normal que a palavra "peregrinação" seja mais do que adequada para se referir à visitação da mostra. E religiosos não faltam nessa empreitada. Agop Basmacilar, 76, arquidiácono da Igreja Apostólica Armênia, em São Paulo, visitava, pela segunda vez, a mostra, na última quarta. Orgulhoso, Basmacilar contou que a trilha sonora da exposição "é a mesma que eu canto lá na igreja".
A mostra, segundo a diplomata Helena Gasparian, também descendente de armênios, foi organizada "em tempo recorde": "Nossa primeira reunião ocorreu em fevereiro. Em menos de quatro meses conseguimos montar tudo. Foi um milagre".
Em sua maioria, os imigrantes armênios chegaram ao Brasil em 1926, fugindo do genocídio. Hoje, segundo Ochin Leon Mosditchian, um dos responsáveis pela mostra, estima-se que em São Paulo vivem 50 mil descendentes. "Nós não sabíamos que tínhamos um tesouro tão valioso. Com isso, conquistamos dois benefícios: apresentar para novas gerações princípios e tradições desconhecidos e mostrar o vínculo entre arte e fé", conta Mosditchian.
Após "Ararat", o ciclo de debates paralelo à mostra segue na próxima semana, dia 25, com o tema "A Imigração Armênia no Brasil", com palestra de Sossi Amiralian; no dia 8 de junho, com "A Pintura Armênia no Século 19", que será abordada por Shahen Khachatryian, curador da mostra, e no dia 15 de junho, sobre "A Pintura Armênia no Século 20", também a ser tratada por Khachatryian. Todas as palestras são gratuitas.


TESOUROS DE ETCHMIADZIN. Mostra com cerca de 70 peças litúrgicas do Museu de Etchmiadzin e ciclo de debates todas as terças, às 18h30 (gratuitas). Curadoria: Shahen Khachatryian. Quando: de ter. a dom., das 10h às 18h. Até 20/6. Onde: Pinacoteca do Estado (pça. da Luz, 2, Bom Retiro, tel. 0/xx/11/ 229-9844). Quanto: R$ 4. Patrocinador: banco Sofisa.


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