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61º FESTIVAL DE CANNES
Personagem sem nome foi desafiador, diz Moore
Atriz conta ter achado difícil "encontrar vida no mundo sem passado" do filme de Meirelles
Em Cannes, a protagonista de "Ensaio sobre a Cegueira" afirma que "conseguir papéis bons é difícil" mesmo para atores experientes
Anne-Christine Poujoulat/ France Presse
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A americana Julianne Moore na cerimônia de abertura do Festival de Cannes, na última quarta-feira
SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A CANNES
Em "Ensaio sobre a Cegueira", o filme do diretor brasileiro
Fernando Meirelles que abriu o
61º Festival de Cannes, na última quarta, a atriz americana
Julianne Moore faz o papel da
única na história a enxergar.
A performance de Moore como a mulher do médico (os personagens não têm nome no livro de José Saramago e assim ficaram na versão cinematográfica) foi elogiada até por críticos que desgostaram do filme.
Moore, no entanto, não fez
pose de estrela em Cannes. A
uma sala lotada de jornalistas,
no dia da exibição do longa, ela
não escondeu a expectativa que
teve pelo papel: "Quando meu
agente me ligou, três meses antes de o filme começar a ser feito, dizendo que havia a chance
de eu receber um convite de
Fernando Meirelles, falei:
"Nem brinca com isso!'".
À Folha e a outros sete jornalistas internacionais com
quem se encontrou no hotel
Martinez, no dia seguinte à estréia, Moore justificou seu entusiasmo. "Não importa com
que idade você esteja, em que
ponto da carreira, se é homem
ou mulher. Conseguir papéis
bons é sempre difícil. E você
tem pouco controle sobre isso."
Aos 47, ela acumula quatro
indicações ao Oscar e uma galeria de personagens marcantes em filmes como "Tio Vânia
em Nova York" (Louis Malle,
1995), "Magnólia" (Paul Thomas Anderson, 1999), "Fim de
Caso" (Neil Jordan, 1999) e
"Longe do Paraíso" (Todd Haynes, 2002).
Quando um jornalista inglês
disse que ela é uma das melhores atrizes da atualidade, além
de símbolo sexual, Moore corou, depois sorriu, agradeceu e
brincou. "Por que só nos deram
meia hora de entrevista? Vamos esticar a conversa." Mais
trechos da entrevista, a seguir.
FILHOS
Os filhos nunca são como você imagina. E isso é uma grande
lição. Temos a tendência de definir tudo pelo que vemos ou
pelo que pensamos estar vendo. Fazemos uma imagem dos
filhos e, quando eles nascem, é
uma surpresa: "Oh, é você!".
Com a diferença, você vê que
eles são totalmente independentes de você. Minha filha
nasceu com cabelos pretos, um
topete, e era enorme. Pensei:
"De quem é esse bebê?" Você
tem esse momento de ajuste,
de ver que as coisas não são como você pensava que seriam.
TRABALHO E FAMÍLIA
Tenho um trabalho de sorte.
Terminei de filmar "Ensaio sobre a Cegueira" em setembro
[de 2007] e não voltei a trabalhar antes de março. Isso é ótimo também no aspecto familiar. Meus filhos [uma menina e
um garoto] adoraram "Ensaio
sobre a Cegueira". Eles foram
comigo para as filmagens no
Canadá. Tínhamos uma piscina
e um jardim. Todos os dias eles
iam para as filmagens e jogavam futebol com o Quico, filho
do Fernando [Meirelles].
IDADE
Quanto mais você envelhece,
mais você gosta da vida.
BONS PAPÉIS
Não importa com que idade
você esteja, em que ponto de
sua carreira, se você é homem
ou mulher. Conseguir papéis
bons é sempre difícil. E você
tem pouco controle sobre isso.
PERSONAGEM SEM NOME
Foi interessante para mim e
duro para todos encontrar um
caminho para essa convenção
[do filme] de não ter nomes. Foi
difícil. Nós nos demos conta de
quão forte é a identificação que
temos com os nossos próprios
nomes. Mas essa era a convenção do filme. Tínhamos que trabalhar com esses parâmetros.
Nunca pensei num nome para
ela. Foi muito, muito desafiador. O desafio era encontrar
uma vida naquele mundo, sem
ter nome nem passado. Como
você constrói uma vida assim?
CHORO NO FILME
O choro é uma dessas coisas
virtuais, que você não faz. Você
sempre tenta não chorar. A última coisa que você quer é fazer
você mesma chorar. Vou contar
que não é nada fácil chorar
atuando com um cachorro [numa cena do filme, o Cão das Lágrimas lambe o rosto de Julianne quando ela chora].
CENA DE ASSASSINATO
Acho muito trágico quando
ela mata. Ela fica muito emocionada depois do ato, pensando como é horrível tirar a vida
de alguém. Você vê muitos filmes em que isso é feito de forma muito fácil. Uma das coisas
que me perguntaram muito é
por que ela não faz isso mais cedo no filme. Achei isso interessante, porque me pareceu uma
convenção do cinema. Alguém
vê algo errado, vai direto na
pessoa que está errada e mata.
Quando ela mata, o marido
diz: "Você criou outro problema. Você começou uma guerra". Ela vê o problema. Não foi
um ato bobo. E ela não tem uma
visão heróica a respeito de tirar
a vida de alguém, em qualquer
circunstância. Isso é algo profunda e terrivelmente emocionante. Gosto do fato de o filme
caminhar nesse sentido.
CABELOS LOUROS
Ninguém gostou dos meus
cabelos louros. Nem eu. Decidi
pintar para surpreender o Fernando [Meirelles]. Achei que
ser ruiva deixaria a personagem diferente de todos. Queria
que ela fosse mais normal.
CINEMA COMERCIAL
Acho divertido fazer todos os
gêneros de filmes. Fazer um filme como o "Ensaio sobre a Cegueira" e também um filme
bem comercial, um de ação, um
thriller, um drama. Eu me interesso por histórias, tanto histórias de arte quanto histórias comerciais.
ELEIÇÕES AMERICANAS
Eu não detesto [o candidato
republicano] John McCain.
Nunca o encontrei. Mas ele é
extremamente conservador.
Ele é antiaborto; quer nos manter no Iraque pelos próximos,
sei lá, cem anos. Não sou fã desse tipo de políticos. Meu voto é
de [Barack] Obama. Honestamente, eu acho que ele é alguém que de fato pode mudar
os Estados Unidos.
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