São Paulo, domingo, 18 de junho de 2006

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MÔNICA BERGAMO

Reprodução
COM LULA, SEM CAMPANHA Chico Buarque canta por Lula contra Collor; cantor declara voto, mas diz que está fora da campanha

Internet traz vídeos de campanhas eleitorais passadas -com artistas que, na maioria, deixaram os palanques

As estrelas sumiram

VESTIDO DE branco, Chico Buarque segura uma bandeirinha do PT. A atriz Cristina Pereira entoa: "Lula lá/ Brilha uma estrela...". Tássia Camargo continua: "Lula lá..."; e Cláudia Abreu: "Cresce a es-pe-ran-ça". Abraçadas, Gal Costa e Elba Ramalho, de lenço vermelho no pescoço, cantam: "Lula lá..."; e Malu Mader completa: "Com sin-ce-ri-da-de..."

 

As cenas, da campanha presidencial do PT em 1989, estão no site You Tube (www.youtube.com), em que é possível encontrar vídeos curiosos de eleições passadas buscando por palavras-chave como os nomes dos candidatos, por exemplo. O ator José Mayer -com camiseta do candidato Leonel Brizola, que apoiou Lula no segundo turno- também está no vídeo. A coluna telefonou para o celular dele.
 


JOSÉ MAYER - Mas eu apareço? [Pausa] Ah, é... [Risos]

FOLHA - O senhor se lembra?
JOSÉ MAYER
- Olha, querida, eu estou no meio de uma gravação. Cena séria, complicada, de festa, cheia de gente. E não gosto de falar nisso. É passado.

FOLHA - O que o motivou a participar da campanha?
JOSÉ MAYER
- Há 17 anos, era uma obrigação para a classe artística fazer aquilo. Ou era Lula ou era [Fernando] Collor. E o pressentimento dos artistas era de que o Collor seria ruim. Foi um pressentimento certo.

FOLHA - Em quem o senhor pretende votar neste ano?
JOSÉ MAYER
- Olha, querida, já estão me chamando para a gravação. [Grita para alguém ao lado] Já vooou!! [Despede-se e desliga o telefone].

 

Neste ano, deverá ser assim: os eleitores que quiserem ver o primeiro time do estrelato nacional em campanhas eleitorais terão que se contentar com sites como o You Tube. Ao menos entre os militantes que aparecem nos vídeos do site, poucos têm planos de voltar ao palanque. Muitos mudaram o voto; alguns nem querem mais saber de política.
 

Elba Ramalho é um exemplo. Cabo-eleitoral eclética, a cantora apoiou Collor contra Lula em 1989 e mudou de lado no meio da campanha. Em 2002, voltou ao horário eleitoral para defender a candidatura do tucano José Serra à Presidência. Hoje, diz sua assessoria de imprensa, "ela não quer mais se envolver em política".
 

A lista de desiludidos é longa. Aracy Balabanian, que apoiou Lula, "está desencantada com a política", segundo sua assessoria, e não quer falar sobre o assunto. O ator Felipe Camargo é outro ex-Lula. "Estou pensando em votar nulo. Ou então naquela moça..." Heloísa Helena? "É, na Heloísa Helena. Mas campanha não faço mais."
 

Regina Duarte também pulou fora. Ela aparece em pelo menos dois vídeos do You Tube: pede votos para Mário Covas em 1989 e diz, na campanha de Serra de 2002, que tem "medo" da vitória de Lula. Sua assessoria diz que ela não "quer mais falar disso".
 

Ex-malufista de carteirinha, a apresentadora Hebe Camargo protagoniza outra cena desenterrada pela internet, em que pede aos eleitores do patrão Silvio Santos, que havia tido sua candidatura impugnada, que votem em Paulo Maluf. "Já que você não pode votar no Silvio, por que não votar em Paulo Maluf, como eu?", defendia. Passados os anos, Hebe diz que o episódio é coisa do "passado" e que nem é mais amiga de Paulo Maluf. "A amizade era interesseira", já declarou.
 

A debandada geral de artistas dos programas políticos motivou declarações polêmicas do cantor Fagner. No ano passado, para fúria dos colegas, declarou: "[A classe artística] é um bando de "Maria-vai-com-as-outras", que fala o que mandam falar... Ficam gritando "Lula lá!", "Lula lá!", "Lula lá!" e, depois que o Lula faz essa cagada toda, não aparece quase ninguém para comentar."
 

O ator Paulo Betti discorda de Fagner. "Seria pretensão achar que as pessoas não têm discernimento. Gosto de dar minha opinião."
 

Da campanha de 1989, Betti diz guardar boas lembranças. "Era emocionante. Quero ver esse vídeo. Qual é o site?", diz ele, que também deve ficar de fora dos programas do PT neste ano. "Provavelmente não participe porque devo estar no ar [em alguma novela]". Ele se refere à orientação da TV Globo, reiterada recentemente em carta a todo o elenco, para que os artistas que estejam na programação não façam campanha na TV. "Mas declaro meu voto em Lula. O Brasil está melhor com ele."
 

Paulo Betti não está só. A sambista Beth Carvalho, que apoiou Brizola no primeiro turno das eleições de 1989 e Lula no segundo, mantém o voto. "Agora eu vou votar no Lula desde o princípio. A outra opção [Geraldo Alckmin] é inviável. PSDB, FHC e Alckmin, Deus me livre!", diz ela. "Mas minha campanha é dizer a quem eu puder para votar no Lula." Chico Buarque diz o mesmo: vota em Lula, mas quer distância dos palanques.
 

Já Tássia Camargo encheu sua página no Orkut [sim, ela está no site] de comunidades como "Lula lá sem medo de ser feliz", "Realizações - Lula presidente" e até "O Mapa da Corrupção de FHC", criada por ela.
 

Malu Mader e Cláudia Abreu, duas das mais eloqüentes no vídeo do "Lula lá", estão entre os artistas que não responderam aos telefonemas da coluna. A assessoria das atrizes disse que enviaria um fax para ambas com perguntas sobre o assunto, mas não houve resposta. O ator Lima Duarte, que fez campanha para Mário Covas, também não retornou. Gal Costa, diz sua assessoria, não pôde responder porque está viajando.
 

A atriz Joana Fomm faz questão de contar sua desilusão. No vídeo de Lula, ela veste a camisa do Partido Verde, pró-PT no segundo turno em 1989. "Aquela coisa dos artistas em torno do Lula foi o último respiro do nosso idealismo. Agora acabou. Fiz por convicção, pelo Lula, e entrei pelo cano. Eu acreditava naquilo, sabe? Agora não tenho coragem de interferir na opinião de ninguém".


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