|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
GASTRONOMIA
O melhor chef traz à vista e ao paladar simplicidade e bom gosto
NINA HORTA
Colunista da Folha
Acabou-se o Fispal Gourmet
Show, que foi um sucesso, comandado pelo chef Laurent Suaudeau.
O que é este show? Nada mais do
que concursos de culinária que
têm como objetivo preparar e qualificar profissionais brasileiros integrando-os num contexto internacional. Incentivam o trabalho
que já vem sendo feito por escolas
privadas, como o Senac, e particulares, como a de Suaudeau e outras. A ênfase é dada à
identidade culinária dos
países e Estados competidores.
Seriam mesmo competidores? É claro que não.
São profissionais que
compartilham, dentro de
regras estabelecidas, todo o seu know-how e
criatividade. Com bom
humor, alegria e companheirismo.
Fui convidada, o que muito
me honrou, a ser jurada do
concurso Jovens Talentos. O objetivo deste concurso é conscientizar o cozinheiro de sua identidade brasileira, abrir seus olhos
para os produtos de sua terra e
sua valorização, e fazer contato entre os jovens talentos deste nosso enorme
Brasil. O lema seria qualquer coisa como: "Ser
para Ter".
Os "temas" a serem
cozinhados e desenvolvidos em
receitas de
bom sabor, beleza
e originalidade
eram o mero e a lagosta.
Caí no partido da lagosta, com
muito gosto. Dentro de suas pequenas e bem aparelhadas cozinhas, os chefs trabalhavam suas receitas. Trouxeram ou mandaram
vir de casa os produtos típicos de
suas regiões e muitos de nós vimos
pela primeira vez o ora-pro-nóbis
e a vinagreira. Vestiam-se do branco perfeito e tinham o timing perfeito de relógios suíços, sem nervosismos ou afobações.
Faz anos que venho escutando o
"bate-bate em pedra dura tanto
bate até que fura" do chef Laurent
Suaudeau. Quantas e quantas vezes o escutei dizer que os cozinheiros precisam de técnica, muita técnica, disciplina e mais
isto e aquilo. Quantas vezes também duvidei disso, pensando com
meus botões que a comida brasileira, tendo sido sempre pobre, sem
influência de uma rica corte, não se
complicou. Para manter a identidade bastariam os ingredientes da
terra e uma boa mão. Hoje não
penso mais assim. Vejo a culinária
como um processo, uma cena de
mudança, um ir e vir, e as técnicas
são, sim, imprescindíveis para "segurar" uma cozinha de peso que
quer ter seus pés firmes na terra e
progredir ao mesmo tempo.
Vamos ver se consigo me explicar. O melhor chef é o de melhor
avesso, como nos bordados finos.
Aquele que aprendeu tão
bem as técnicas que, ao transpor
sua receita para o prato, traz à vista
e ao paladar somente a simplicidade e o bom gosto. Os truques e todo
o seu aprendizado são o avesso
precioso.
Uso o exemplo do chef que tirou
o segundo lugar. Uso também a
memória, que pode ser traiçoeira.
Dentre tantas, lembro-me de uma
cauda de lagosta pequena, cozida
no ponto certo, em água, cheiro-verde, coentro e sal. Sal, muito importante o sal, pois a lagosta é doce. O recheio dava um toque vivo e
brasileiro. E sabem o que era? Um
purezinho de abóbora com carne-seca. E muito bom. Do lado, como
guarnição, uma pequena cesta sem
alça, de acabamento
perfeito, feita de
couve,
que segurava dentro
um suflê de
arroz com
leite de coco.
Mais não teria, era a
simplicidade
em pessoa.
E vimos cuscuzinhos de lagosta
sobre coulis de agrião. Tuiles de
camarão seco, sim senhores...
Nota dez a todos e parabéns
aos vencedores de Bahia,
Ceará e São Paulo. Que
bons ventos os levem aos
seus estágios de Bocuses
da vida e que ensinem e que
aprendam são nossos votos. Até o próximo!
Texto Anterior: Noite Ilustrada - Erika Palomino: Cultura club e glamour para quem precisa Próximo Texto: Dicas do Ed: Meu último gole; adeus Índice
|