São Paulo, terça-feira, 18 de julho de 2000


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Exibição brasileira reforça ruptura freudiana

DA REPORTAGEM LOCAL

Na estrutura, o divã de Freud é um móvel simples, mas sempre recoberto por um requintado tapete iraniano que praticamente esconde a sua forma original.
É também um móvel pequeno, com cerca de um metro e meio de comprimento, de modo que os pacientes não estendiam seu corpo como em uma cama, mas apenas se recostavam. Numa de suas extremidades, há uma almofada na forma de rolo, recheada de pêlos de cavalo.
Foi um presente dado a Freud por madame Benvenisti, sua paciente, em 1890. Ele ainda não tinha escrito "A Interpretação dos Sonhos", obra que está comemorando um século neste ano.
Quando deixou Viena em 1938, fugindo do nazismo, Freud levou consigo o móvel, que é hoje a principal atração do museu que leva seu nome, em Londres.
No Museu de Arte de São Paulo, o divã ocupará o mesmo lugar de honra da exibição americana de "Freud: Conflito & Cultura". Mas o visitante terá muito o que ver antes de chegar até ele.
A exposição original é dividida em três partes: "Os Anos de Formação", "O Indivíduo: Terapia e Teoria" e "Do Indivíduo à Sociedade". Aqui, ganhará uma mostra brasileira, cujo título provisório é "Psicanálise e Modernismo".
A primeira parte abre com a certidão de nascimento de Freud -que nasceu em 1856, em Freiberg (então parte do Império Austro-Húngaro e hoje na República Tcheca, com o nome de Pribor). Traz também manuscritos dos primeiros ensaios, inclusive o famoso estudo sobre a cocaína.
Na segunda parte, os destaques são as traduções de Freud das aulas de Charcot, cartas ao amigo W. Fliess, a primeira edição de "A Interpretação dos Sonhos" e os manuscritos de "Cinco Lições de Psicanálise" (1910) e "Para Além do Princípio do Prazer" (1920).
No terceiro módulo, devem chamar a atenção os manuscritos de "Totem e Tabu" (1912), "O Futuro de Uma Ilusão" (1927) e "Moisés e o Monoteísmo" (1939).
Todos os objetos serão exibidos em vitrines de madeira e vidro. Monitores de TV espalhados pela mostra apresentarão imagens que testemunham a influência da psicanálise em produtos da cultura de massas, como revistas, filmes e desenhos animados.
Os filmes domésticos que registram a imagem de Freud serão projetados no cinema do museu. Um festival de filmes que abordam temas relacionados à psicanálise está sendo preparado com a Cinemateca Brasileira.
O objetivo do módulo brasileiro, segundo Leopold Nosek, é mostrar o aspecto crítico e de ruptura do pensamento freudiano, bem como diálogo que ele estabelece com as artes e a cultura, no caso o modernismo.
"Ela tem um cunho didático, crítico e militante, ao voltar-se para a brasilidade, para o próprio meio e os psicanalistas brasileiros", diz Nosek.
A parte brasileira reunirá obras de quatro artistas plásticos -Tarsila do Amaral, Cícero Dias, Ismael Nery e Flávio de Carvalho- com poemas e textos de Mario de Andrade, Oswald de Andrade e Carlos Drummond de Andrade que aludem à psicanálise.
"A exposição americana é linear, hipótese, tese e demonstração. Vamos seguir a forma original. A exposição brasileira, no entanto, sem abandonar as teses, terá o modelo de uma constelação", explica o crítico e diretor de cinema Olívio Tavares de Araújo, um dos curadores da exposição.
Ao mesmo tempo em que investiga as relações dos modernistas com a psicanálise, a mostra introduzirá o público na história do movimento no Brasil.
Vai apresentar o trabalho de pioneiros como Durval Marcondes (1899-1981) e Adelheid Koch (1896-1980), psicanalista alemã enviada ao país nos anos 30, pela Associação Psicanalítica Internacional, para ajudar na formação de terapeutas.
As pesquisas para a exibição brasileira, realizadas por uma equipe que já trabalha há quase um ano, basearam-se no livro "Álbum de Família: Imagens, Fontes e Idéias da Psicanálise em São Paulo", obra coletiva coordenada por Leopold Nosek, de 1994.
"As idéias da psicanálise chegaram ao Brasil por uma via científica e também por uma via artística", diz a psicanalista Maria Angela Gomes Moretzsohn, também curadora da mostra. "A exibição brasileira abre o campo para muitas pesquisas futuras."
Para quem tem pressa, a versão digital da exposição da Biblioteca do Congresso está no site: http://lcweb.loc.gov/exhibits/freud. O site reproduz a maior parte do material exposto, inclusive os depoimentos gravados por Freud para a BBC de Londres. (ALN)


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