São Paulo, segunda-feira, 18 de julho de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

CRÍTICA TERROR

Filme escolhe viés político para tratar de horrores sexuais

"A Serbian Film: Terror sem Limites" associa violência extrema da ficção aos traumas da vida naquele país


O FUNDO POLÍTICO NÃO É INÉDITO NAS PRODUÇÕES "DE CHOQUE": É O RECURSO SOFISTICADO DE PASOLINI EM "SALO"


ALEXANDRA MORAES
EDITORA-ADJUNTA DA ILUSTRADA

A decisão de ver ou não ver "A Serbian Film: Terror sem Limites" é maior que a própria obra. Violência, estupros em série, sugestões de pedofilia e uma sucessão de cenas grotescas deveriam ser suficientes para um "não".
Os defensores do filme, porém, argumentam que trata-se de arte, não de realidade, e que o que é mostrado é "a humanidade", ainda que em seus piores aspectos. Nisso há alguma razão: se o que está ali não existisse, não teria como ser imitado.
Mais do que imitação da crueldade, o filme traz uma discussão razoável. O que um pai de família, ex-ator pornô, é capaz de fazer quando falta dinheiro -e o que a indústria pornô ainda pode oferecer de "novidade".
Para fazê-lo voltar ao batente, surge algo como um "Exército do Mal", comandado por um diretor com trejeitos de malvadão da Disney. O homem cede e entra num acordo mefistofélico em que não sabe ao certo o que vai fazer, mas sabe que vai ganhar muito dinheiro. Vira protagonista de cenas de horror sexual.
Tenta-se forçar um fundo mais amplo e político para a desgraça: "Eu, você e este país somos vítimas", diz o diretor ao ator pornô, inclinado a desistir da empreitada.
"Este país" é a Sérvia, que até outro dia, sob Slobodan Milosevic, empregava a violência sexual como arma de guerra. Ao escolher carimbar a nacionalidade já no título, a produção faz questão de se associar aos traumas sérvios.
Liga a violência extrema da ficção à purgação da violência extrema da realidade. O fundo político não é inédito nas produções "de choque": é o recurso sofisticado de "Salò" (1975) de Pier Paolo Pasolini, em que a humilhação sexual e moral é imposta por fascistas a um grupo de adolescentes no fim da Segunda Guerra Mundial.
No caso sérvio, o discurso político é espasmódico e permeado pela noção de que existe uma política própria da indústria pornográfica.
O horror é empregado num crescendo, que acompanha o cinismo do diretor pornô tanto quanto o cinismo do próprio espectador, real destinatário das imagens "de choque". Na maratona de horror sexual, o importante mesmo é ter alguém filmando -e muita gente vendo.
"A carne e a alma de uma vítima são transmitidas àqueles que a perderam e que agora estão pagando por ela", diz o diretor pornô. O personagem afirma ainda: "Nós somos vítimas".
"Não. Somos retardados", rebate o ator, mais afeito à realidade.

A SERBIAN FILM: TERROR SEM LIMITES

DIREÇÃO Srdjan Spasojevic
PRODUÇÃO Sérvia, 2010
COM Srdjan Todorovic, Sergej Trifunovic
ONDE Rio Fan, dia 23/7, às 20h
AVALIAÇÃO Ruim


Texto Anterior: É um horror
Próximo Texto: Filme de John Carpenter abre hoje o festival
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.