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CINEMA/ESTRÉIA
"EU TU ELES"
Pela primeira vez protagonizando filme, ela retoma ofício de atriz, do qual estava afastado havia cinco anos
"Tenho cara e mão de pobre", diz Regina Casé
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Com a mão nas cadeiras, descendo de um jegue ou trepando
na carroceria de um pau-de-arara, Regina Casé, 46, dá o tom logo
na primeira sequência: o que se
verá nos 104 minutos de "Eu Tu
Eles" diz mais à atriz genuína do
que à entrevistadora "legal".
"O filme me devolveu uma coisa
que eu já tinha, mas abandonei e
não sabia onde havia enfiado",
diz. "Tinha saudade de atuar."
A interpretação anterior data de
cinco anos atrás, quando protagonizou o curta-metragem "Lá e
Cá", de Sandra Kogut. Na mesma
época, encerrou a temporada do
monólogo "Nardja Zulpério", dirigido por Hamilton Vaz Pereira,
parceiro, nos anos 70, do grupo
Asdrúbal Trouxe o Trombone.
Carioca de ascendência nordestina (por parte dos avós), Casé diz
que não encontrou dificuldade
para compor Darlene Linhares, a
personagem inspirada na história
real da cearense Maria Marlene
Sabóia da Silva, 54.
"Eu tenho cara de pobre, pé de
pobre, mão de pobre, cabelo de
pobre. Não precisei fazer uma
composição muito longínqua."
Como a Rede Globo tirou o
"Muvuca" do ar, Casé está inclinada a novos projetos para o cinema -ainda não definiu quais. A
seguir, trechos da sua entrevista.
JEITINHO - Durante dez anos viajando pelo Brasil, entrevistando
anônimos, fui a tantas casas como
essas do filme, conheci tanta gente como Osias (Lima Duarte), Zezinho (Stênio Garcia) e Ciro (Luiz
Carlos Vasconcelos), que é como
se eu tivesse uma coleção.
Já sabia como subir no caminhão, descer do jegue, debulhar o
milho, acender ou abanar o fogão
à lenha, enfim, eu tinha um milhão de gestos, o jeitinho de andar, de dançar. Foi quase como
um transbordamento. Darlene
veio buscar, nesse meu inventário
de coisas, o que ela queria.
FERNANDONA - A Fernanda
Montenegro ligou e disse: "Você
tem de ser atriz". Era um elogio,
mas parecia uma bronca.
SOBREVIVÊNCIA - O filme não
tem maiores elucubrações psicológicas. Pessoas como a Darlene
realizam quase um milagre diário
para sobreviver. Assim como essa
gente aproveita até o talo tudo que
a vida dá, em relação ao afeto, ao
sexo, à capacidade provedora de
cada um dos homens do filme,
por exemplo, Darlene também
não pode jogar nada fora.
PÓS-FEMINISMOEm algumas
sessões, seguidas de debate, as espectadoras saíam com a bola
cheia, felicíssimas, tanto no Brasil
como lá fora. Outro dia, porém,
ouvi o comentário de uma mulher que destruiu tudo isso. Ela dizia assim: "Tudo bem, vocês estão
dizendo que a mulher é incrível,
mas isso tudo só deu certo porque
havia apenas ela, e o resto eram
homens. Se tivesse mais "meia-mulher", daria confusão".
Filme: Eu Tu Eles
Direção: Andrucha Waddington
Produção: Brasil, 2000
Com: Regina Casé, Lima Duarte, Luiz
Carlos Vasconcelos, Stênio Garcia
Quando: a partir de hoje, nos cines Belas
Artes, Espaço Unibanco 1 e circuito
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