São Paulo, segunda-feira, 18 de setembro de 2000

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RELÂMPAGOS
Mouro

JOÃO GILBERTO NOLL

Tomou de si um afago tímido, tremulante até, e o suspendeu no alto, enquanto pensava quem poderia receber o que já se desfazia no ar, sob a marquise descascada da esquina. Perto, uma ambulância com a porta traseira aberta, à espera sabe-se lá de quem. Olhou, sem muito fixar, a maca lá dentro. O cobertor dobrado. E continuou, porque não seria ele a parar naquele ponto, espiando a exposição da vaga para uma dor alheia -ou não, pois aquela ambulância poderia estar em perfeito descanso, aberta assim só para arejar. Era um dia quente, disso tinha certeza, e mais certeza teria se cumprisse até o fim o que estava a fazer naquele instante: entrava no quarto, ligava o ventilador, despia-se, deitava, morria para o mundo como um mouro que desfalece em sua tenda no deserto, enfim...



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