São Paulo, segunda-feira, 18 de setembro de 2000

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Tragtenberg tem obra lançada em pacote de sete CDs

CARLOS ADRIANO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Militando na pesquisa de ponta da composição e esparramando seus arranjos por várias trilhas, Livio Tragtenberg é um autor original e instigante. Executa na música um guisado de timbres e procedimentos, que demarcam sua aventura de invenção.
Não é nenhum bicho, mas são sete cabeças (compactações sonoro-cerebrais), em distribuição regular. O selo Demolições Musicais, de Livio e Wilson Sukorski, está lançando "Através da Janela" e "São Paulo, a Symphonia da Metrópole", em pacote que traz outros cinco CDs -à venda no site www.alternetmusic.com.br.
O pacote é um cúmulo de energia sonora. Os CDs solo são "Anjos Negros", "É a Noite - Othello", "Pasolini Suite / Hänsel und Gretel Suite". E ainda "TemperaMental", com Sukorski e Décio Pignatari, e "Bazulaques Brasileiros", com Marcelo Brissac.
Na próxima sexta-feira, o requisitado compositor lança o CD "Bazulaques", com show na Haus der Kulturen der Welt, Berlim. Antes, no dia 15, foi aberta a instalação "Amazônia in Loop" (gravações indígenas reeditadas com sons inventados), no início do Festival Amazônia/Quase Amazônia.
Na elaborada escritura composicional de Livio, estão em pauta não só colcheias, mas também letras, em repertório de clara precisão. Provam seus livros de teoria, crítica e polêmica "Música de Cena" e "Artigos Musicais" (editados pela Perspectiva) e "Contraponto" (Edusp), manual para autodidatas, como seu autor.
Nesta "terra de surdos-músicos", o som de Livio Tragtenberg é um terremoto que remove o chão batido da mesmice e nos leva à experiência rara de ouvir informação nova.

Folha - Quais as diferenças entre compor para um filme ou peça e fazer música por necessidade própria?
Livio Tragtenberg -
Nunca me coloquei a questão, como processo ou tipo de impulso criativo. Sempre me interessou mais estabelecer diálogos, seja com outros códigos ou com outros criadores. Assim, minha música não muda substancialmente ao responder a uma encomenda ou a um impulso espontâneo de criação.

Folha - Qual a relação da música com um texto preexistente?
Tragtenberg -
A relação é sempre de diálogo. Não busco o apoio puro e simples. Busco identificar a cadeia de conexões e intenções que estruturam o texto, e a partir de uma aproximação crítica, organizo o meu material sonoro. Em meu trabalho no cinema, busco soar o que não pode ser visto.

Folha - Como é seu processo de criação e trabalho?
Tragtenberg -
Não separo criação de trabalho. Há quase dez anos trabalho sob pressão, com prazos. Isso me estimula. Componho, ou seja, coloco, coordeno sons e idéias. Meu processo é mais de deformação que de criação.

Folha - O que são os rótulos de música popular e erudita?
Tragtenberg -
São categorias que se relacionam ao século passado e ao passado. São sobretudo categorias de status social. A música mais acadêmica é a da academia... Ela é "erudita" no pior sentido da palavra. A música de hoje simplesmente obsoletou essas categorias tanto de forma estética como mercadológica. As viúvas da música erudita são as carpideiras de um templo perdido, uma burguesia de três tenores. E, por outro lado, a música popular de bundas loiras, baianas, sertanejas e pagodeiras e o lixo entorpecente teen deveriam ser proibidos pelo Ministério da Saúde como prejudicial à alma da raça. Vivemos uma overdose sonora. A questão de hoje é buscar o silêncio.

Folha - Para você, o que é música?
Tragtenberg -
Não tenho concepção sobre o que seja. Quando souber, acho que me desinteresso pela coisa. Ou seja, é o desconhecido, a surpresa.


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