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Frateschi faz revisão do clássico
"Tio Vânia"
Diretor deixa de lado cenário realista e ousa no elenco
GABRIELA MELLÃO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Celso Frateschi vive o desafio
de encenar pela terceira vez
"Tio Vânia", obra-prima de Anton Tchecov (1860-1904). O
ator, diretor, dramaturgo e
atual presidente da Funarte
aventurou-se pelo texto inicialmente no final da década de 80,
época em que lecionava na
EAD (Escola de Arte Dramática) e encenou um espetáculo
amador, com alunos.
Em 2000, escolheu o texto
para inaugurar o teatro Ágora,
espaço que abriu com o diretor
Roberto Lage. Agora, elege a
obra de novo, concebendo uma
montagem ousada, que estréia
amanhã no mesmo local.
"Essa peça tem grande dimensão poética, e a cada período da vida me diz coisas novas.
É inacreditavelmente atual.
Questiona nossa qualidade de
vida de forma vertical, sarcástica, irônica e divertida. Além
disso, nenhum autor se aproxima de Tchecov na abordagem
das relações humanas", diz
Frateschi.
Não apenas o texto foi repensado. "Fiz uma grande revisão
do ponto de vista estético." O
processo exigiu sobretudo tempo, que é também o tema central da obra encenada.
"Tio Vânia" retrata a vida
desperdiçada dos integrantes
de uma família infeliz do interior da Rússia, a partir da tomada de consciência do quarentão
Vânia. Ao se apaixonar pela
atual esposa de seu ex-cunhado, a bela Helena, Vânia se dá
conta de que sacrificou juventude, ambições intelectuais e
pessoais, trabalhando em vão.
Frateschi faz bom uso do
próprio tempo. Acrescenta à
história interferências poéticas. Desprende-se dos cenários
realistas usados na encenação
anterior. "Optei por uma direção mais conceitual", conta.
Círculo
O relógio com ponteiros parados, presente como ornamento na versão de 2000, vira
simbologia. Sai da parede e aparece retratado no piso. No lugar
dos ponteiros, velas queimam à
frente do espectador. Toda a
concepção do espetáculo se dá
de forma circular -uma representação da passagem do tempo e do ciclo de vida viciado que
faz com que, no final, apesar de
os personagens terem adquirido consciência, eles retomem
os hábitos de sempre.
Nesta versão, Frateschi também se liberta de aparências.
"Busco a alma dos atores", diz.
É por isso que escala um ator
negro para compor o elenco de
russos: o jovem Sidney Santiago. "Sua atuação é estonteante
e rompe com qualquer tipo de
padrão", avalia. Rejeita convenções também ao escolher o ator
e palhaço Angelo Brandini para
o papel-título.
Tchecov se dizia um autor de
comédia. Deixou claro sua insatisfação pelo tom constantemente dramático com o qual
Stanislavski encenava sua obra.
"Imagino que tenhamos chegado a um trabalho mais próximo
do desejo de Tchecov", afirma
Brandini.
O diretor buscou complexidade nas interpretações, variações aos múltiplos estados da
alma humana. Inspirou-se numa carta escrita pelo autor, na
qual ele admitia perceber na estrutura de concertos musicais a
mesma diversidade presente
nas emoções humanas.
"Tentei revelar os aspectos
mais verdadeiros da obra.
Fiz um mergulho fundo", afirma Frateschi sobre o resulta-
do do espetáculo, produzido
durante seu período de férias
da Funarte.
TIO VÂNIA
Quando: sex. e sáb., às 21h, e dom., às
19h; até 21/12
Onde: teatro Ágora (r. Rui Barbosa,
672, tel. 0/xx/11/3284-0290)
Quanto: R$ 20
Classificação indicativa: não recomendado para menores de 12 anos
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