São Paulo, quinta-feira, 18 de setembro de 2008

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Frateschi faz revisão do clássico "Tio Vânia"

Diretor deixa de lado cenário realista e ousa no elenco

GABRIELA MELLÃO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Celso Frateschi vive o desafio de encenar pela terceira vez "Tio Vânia", obra-prima de Anton Tchecov (1860-1904). O ator, diretor, dramaturgo e atual presidente da Funarte aventurou-se pelo texto inicialmente no final da década de 80, época em que lecionava na EAD (Escola de Arte Dramática) e encenou um espetáculo amador, com alunos. Em 2000, escolheu o texto para inaugurar o teatro Ágora, espaço que abriu com o diretor Roberto Lage. Agora, elege a obra de novo, concebendo uma montagem ousada, que estréia amanhã no mesmo local. "Essa peça tem grande dimensão poética, e a cada período da vida me diz coisas novas. É inacreditavelmente atual. Questiona nossa qualidade de vida de forma vertical, sarcástica, irônica e divertida. Além disso, nenhum autor se aproxima de Tchecov na abordagem das relações humanas", diz Frateschi. Não apenas o texto foi repensado. "Fiz uma grande revisão do ponto de vista estético." O processo exigiu sobretudo tempo, que é também o tema central da obra encenada. "Tio Vânia" retrata a vida desperdiçada dos integrantes de uma família infeliz do interior da Rússia, a partir da tomada de consciência do quarentão Vânia. Ao se apaixonar pela atual esposa de seu ex-cunhado, a bela Helena, Vânia se dá conta de que sacrificou juventude, ambições intelectuais e pessoais, trabalhando em vão. Frateschi faz bom uso do próprio tempo. Acrescenta à história interferências poéticas. Desprende-se dos cenários realistas usados na encenação anterior. "Optei por uma direção mais conceitual", conta.

Círculo
O relógio com ponteiros parados, presente como ornamento na versão de 2000, vira simbologia. Sai da parede e aparece retratado no piso. No lugar dos ponteiros, velas queimam à frente do espectador. Toda a concepção do espetáculo se dá de forma circular -uma representação da passagem do tempo e do ciclo de vida viciado que faz com que, no final, apesar de os personagens terem adquirido consciência, eles retomem os hábitos de sempre. Nesta versão, Frateschi também se liberta de aparências. "Busco a alma dos atores", diz. É por isso que escala um ator negro para compor o elenco de russos: o jovem Sidney Santiago. "Sua atuação é estonteante e rompe com qualquer tipo de padrão", avalia. Rejeita convenções também ao escolher o ator e palhaço Angelo Brandini para o papel-título. Tchecov se dizia um autor de comédia. Deixou claro sua insatisfação pelo tom constantemente dramático com o qual Stanislavski encenava sua obra. "Imagino que tenhamos chegado a um trabalho mais próximo do desejo de Tchecov", afirma Brandini. O diretor buscou complexidade nas interpretações, variações aos múltiplos estados da alma humana. Inspirou-se numa carta escrita pelo autor, na qual ele admitia perceber na estrutura de concertos musicais a mesma diversidade presente nas emoções humanas. "Tentei revelar os aspectos mais verdadeiros da obra. Fiz um mergulho fundo", afirma Frateschi sobre o resulta- do do espetáculo, produzido durante seu período de férias da Funarte.

TIO VÂNIA
Quando: sex. e sáb., às 21h, e dom., às 19h; até 21/12
Onde: teatro Ágora (r. Rui Barbosa, 672, tel. 0/xx/11/3284-0290)
Quanto: R$ 20
Classificação indicativa: não recomendado para menores de 12 anos



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