São Paulo, sexta-feira, 18 de setembro de 2009

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Álbum inaugural do movimento completa 15 anos e ainda é referência

MARCUS PRETO
DA REPORTAGEM LOCAL

"Da Lama ao Caos", 15. Lançado pelo pernambucano Chico Science (1966 -1997) e sua banda, a Nação Zumbi, o álbum que dividiu águas na música pop-popular brasileira dos anos 90 ganha baile de debutante nesta noite (leia ao lado).
A mesma data redonda estimula balanços, análises e (auto) avaliações. Quais os efeitos reais desse petardo -e do "movimento" mangue beat, lançado por ele e repercutido no disco seguinte, "Afrociberdelia" (1996)- no que foi feito na cultura do país a partir disso?
"Na boa, esse disco influenciou toda a geração que veio depois dele", garante Carlos Eduardo Miranda, produtor musical de bandas como Mundo Livre S/A, Raimundos, Skank e O Rappa. "E eu não estou falando só de música, mas também de moda, de cinema."
Segundo Miranda, a "maneira livre" de criar que muitas dessas bandas têm hoje é influência em parte dos Mutantes, em parte do mangue beat.
Ele conta que, quando o primeiro álbum do Mundo Livre foi lançado, a ideia era confundir. "A gente inventou que não era "beat", mas "bit" - isso pra não acharem que se tratava simplesmente de uma batida de maracatu com hip hop e metal por cima. As pessoas ouviam aquilo e entendiam como um gênero musical. Não era."
O rótulo "mangue beat" ainda confunde. Produtor de "Afrociberdelia", Eduardo BID lembra que o conceito nasceu com outro viés: o ideológico.
"Acompanhei aquilo de perto e considero o mangue beat muito mais um grito de "ei, a gente existe e nosso Estado também tem muito o que dizer para o Brasil" do que um movimento musical ou estético."
Ao menos no que diz respeito à repercussão cultural, Recife andava um marasmo na era pré-"Da Lama ao Caos". A capital do Estado que fizera nascer o frevo, a ciranda e o maracatu estava com a autoestima baixa.
"Tinha gente atuando na cidade, mas sem credibilidade nenhuma da plateia", conta o jornalista José Teles, autor do livro "Do Frevo ao Manguebeat". A partir da projeção de Science, Recife refloresceu. Em um único fim de semana chegavam a acontecer dez shows.
A avalanche cultural logo extrapolou a música. O exemplo mais bem acabado disso foi "Baile Perfumado" (1996), primeiro longa de Lírio Ferreira e Paulo Caldas, premiado como o melhor filme daquele ano no Festival de Brasília.
"Muitos filmes feitos hoje em Pernambuco ainda replicam a ousadia e a invenção que o disco trouxe", diz Lírio. "Aquilo despertou a cidade, que passou a respirar uma grande autoestima deflagrada por aquela música. E o cinema veio na sequência, bebendo completamente dessa energia cultural."
Passados esses 15 anos, a novíssima geração musical pernambucana já renega os laços com Science. Lucio Maia, membro-fundador da Nação Zumbi e guitarrista de "Da Lama ao Caos", diz que assiste essa reação "de camarote, às gargalhadas". "Isso tudo também é influência. Influência pelo avesso, mas influência."


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