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Álbum inaugural do movimento completa 15 anos e ainda é referência
MARCUS PRETO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Da Lama ao Caos", 15. Lançado pelo pernambucano Chico Science (1966 -1997) e sua
banda, a Nação Zumbi, o álbum
que dividiu águas na música
pop-popular brasileira dos
anos 90 ganha baile de debutante nesta noite (leia ao lado).
A mesma data redonda estimula balanços, análises e (auto) avaliações. Quais os efeitos
reais desse petardo -e do "movimento" mangue beat, lançado por ele e repercutido no disco seguinte, "Afrociberdelia"
(1996)- no que foi feito na cultura do país a partir disso?
"Na boa, esse disco influenciou toda a geração que veio depois dele", garante Carlos
Eduardo Miranda, produtor
musical de bandas como Mundo Livre S/A, Raimundos,
Skank e O Rappa. "E eu não estou falando só de música, mas
também de moda, de cinema."
Segundo Miranda, a "maneira livre" de criar que muitas
dessas bandas têm hoje é influência em parte dos Mutantes, em parte do mangue beat.
Ele conta que, quando o primeiro álbum do Mundo Livre
foi lançado, a ideia era confundir. "A gente inventou que não
era "beat", mas "bit" - isso pra
não acharem que se tratava
simplesmente de uma batida
de maracatu com hip hop e metal por cima. As pessoas ouviam
aquilo e entendiam como um
gênero musical. Não era."
O rótulo "mangue beat" ainda confunde. Produtor de
"Afrociberdelia", Eduardo BID
lembra que o conceito nasceu
com outro viés: o ideológico.
"Acompanhei aquilo de perto
e considero o mangue beat
muito mais um grito de "ei, a
gente existe e nosso Estado
também tem muito o que dizer
para o Brasil" do que um movimento musical ou estético."
Ao menos no que diz respeito
à repercussão cultural, Recife
andava um marasmo na era
pré-"Da Lama ao Caos". A capital do Estado que fizera nascer
o frevo, a ciranda e o maracatu
estava com a autoestima baixa.
"Tinha gente atuando na cidade, mas sem credibilidade
nenhuma da plateia", conta o
jornalista José Teles, autor do
livro "Do Frevo ao Manguebeat". A partir da projeção de
Science, Recife refloresceu. Em
um único fim de semana chegavam a acontecer dez shows.
A avalanche cultural logo extrapolou a música. O exemplo
mais bem acabado disso foi
"Baile Perfumado" (1996), primeiro longa de Lírio Ferreira e
Paulo Caldas, premiado como o
melhor filme daquele ano no
Festival de Brasília.
"Muitos filmes feitos hoje em
Pernambuco ainda replicam a
ousadia e a invenção que o disco trouxe", diz Lírio. "Aquilo
despertou a cidade, que passou
a respirar uma grande autoestima deflagrada por aquela música. E o cinema veio na sequência, bebendo completamente
dessa energia cultural."
Passados esses 15 anos, a novíssima geração musical pernambucana já renega os laços
com Science. Lucio Maia,
membro-fundador da Nação
Zumbi e guitarrista de "Da Lama ao Caos", diz que assiste essa reação "de camarote, às gargalhadas". "Isso tudo também é
influência. Influência pelo
avesso, mas influência."
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