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Crítica/teatro/"Cindi Hip Hop'/"Machado a 3X4"
Musicais exploram padrões experimentais e diversidade
"Cindi" mistura hip-hop com Brecht; em "Machado", texto consegue ser leve e firme
LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA
"Cindi Hip Hop", do
Núcleo Bartolomeu, e "Machado a
3X4", do grupo Nós do Morro,
têm em comum serem musicais que exploram padrões experimentais. Ambos nascem de
coletivos que aliaram a cultura
dos livros à cultura das ruas e
dos morros para dar voz a jovens da periferia.
O espetáculo "Cindi Hip
Hop", apresentado pelo Núcleo
Bartolomeu em sua sede, é um
exemplo vigoroso do projeto de
criar um teatro hip-hop.
O ponto de partida, a história
de Cinderela, presta-se bem à
discussão do grupo, que é mixar
a tradição do hip-hop paulistano com o teatro épico de
Brecht. Deslocada da versão da
Disney, a fábula da menina
oprimida pela madrasta é oportuna para lidar com questões típicas da juventude periférica
-pais desconhecidos, opções
sexuais interditas, dificuldades
para estudar, a vocação poética.
A saga dos quatro personagens centrais exemplifica em
vários tons esta busca por identidade e o desejo de se reconhecerem com orgulho "na fita".
Na tradição do ator MC (mestre de cerimônia nas celebrações do hip-hop), um que fala,
canta, dança e opera a cozinha
sonora como DJ, os atores desempenham todas essas habilidades com desenvoltura e rigor, afinados pela direção segura de Roberta Estrela d'Alva.
São os frutos das práticas de
formação do Bartolomeu.
O Nós do Morro chega a São
Paulo com seu mais recente
mergulho em Machado de Assis (o primeiro foi há 12 anos),
uma adaptação do conto "O
Alienista". Quem nunca os assistiu tem a grata surpresa de
conhecer um grupo homogêneo, de ótimos atores e atrizes,
fazendo um teatro de grande
vitalidade e apresentando o
texto machadiano com desassombro e leveza.
A história de Simão Bacamarte, transformado de notável cientista, doutorado no exterior, em promotor da sanidade pública na pequena Itaguaí,
desfia-se na velocidade da farsa. Intervenções musicais de
variados tipos e dinâmica de
blocos de atores em movimento materializam a narrativa.
A sugerir uma citação da teatralidade de Antunes Filho, somam-se aos blocos móveis, os
pés descalços e os guarda-chuvas. Mas a origem das idéias importa pouco quando há efetiva
apropriação.
A encenação de Fátima Domingues e Guti Fraga impacta
pelo carisma, pela riqueza das
soluções e liberdade com que
articula a sintaxe dos quadros.
Inventividade
Ambos os espetáculos partilham, ainda, cenografia funcional, figurinos criativos de simplicidade encantadora, e brilhos nos olhos dos seus atuantes. São jovens, mas são maduros. A circunstância de representarem a aliança de culturas
da margem com o centro culto,
os torna únicos no panorama e
atrai a atenção internacional.
O fenômeno representa mais
uma vitória da inventividade
popular sobre o programa da
elite. Como aconteceu com o
samba em meados do século
passado, agora são o rap, o funk,
e as formas culturais associadas
ao hip-hop que, apropriadas
pela periferia, fascinam e capturam os interesses juvenis.
CINDI HIP HOP
Quando: hoje, às 21h, amanhã, às 20h;
últimos dias
Onde: Núcleo Bartolomeu de Depoimentos (r. Dr. Augusto de Miranda,
786, tel. 0/xx/11/3803 9396)
Quanto: R$ 18
Classificação: livre
Avaliação: bom
MACHADO A 3X4
Quando: hoje e amanhã, às 19h30; últimos dias
Onde: Itaú Cultural (av. Paulista, 149,
tel. 0/xx/11/2168-1777)
Quanto: entrada franca
Classificação: não indicado a menores
de 14 anos
Avaliação: bom
RAIO-X
Grupo: Nós do Morro
Fundação: 1986, no Morro do
Vidigal, no Rio
Principais trabalhos: "Machadiando - Três Histórias de Machado de Assis" (1996), "Noites
do Vidigal" (2002), "Os Dois Cavalheiros de Verona" (2007)
Grupo: Núcleo Bartolomeu de
Depoimentos
Fundação: 1999, em São Paulo;
elenco junta atores da periferia
e formandos da Escola Livre de
Teatro de Santo André
Principais trabalhos: "Acordei
que Sonhava" (2003), "Frátria
Amada Brasil" (2006/2007) e
projeto "5x4" (2008)
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