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MÚSICA
Trompetista americano, com 12 CDs elogiados pela crítica nos últimos 14 anos, se apresenta hoje no Bourbon Street
SP recebe "nocautes jazzísticos" de Hargrove
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ele tem nome de lutador de boxe, um certo jeito de lutador de
boxe e um cartel de deixar seus
pares com inveja. Roy Hargrove
sempre ganha por nocaute. E ele
nunca precisou calçar uma luva
de boxe para isso.
Aos 35 anos, o músico americano derruba qualquer adversário
no território do jazz, onde brilha
como um dos principais "pegadores" da última década e pouco.
Detentor de alguns cinturões
importantes, como vitórias das
pesquisas de melhor músico de
seu instrumento por revistas como "Downbeat" ou "Jazztimes", e
com retrospecto de 12 discos positivos ou muito positivos nos últimos 14 anos, ele bota a boca no
trompete esta noite em São Paulo.
No primeiro show imperdível
de jazz na cidade deste 2005, o
músico promete um repertório
"novinho em folha". Esta é uma
das marcas mais fortes deste texano bem-humorado. Descoberto
pelo também gigante do jovem
trompetismo Wynton Marsalis,
Hargrove se diferenciou de seu
mestre pela "variação de golpes".
Já gravou trabalhos mais tradicionais, já fez com um trio rítimico japonês um disco de temas de
desenho animado, visitou as sonoridades de Cuba com o cristalino "Habana" e tem passeado pelo
"groove" e funk nos últimos CDs.
O "camaleão do trompete" falou com a Folha antes do show
que faria no Rio e comentou alguns assuntos polêmicos, como
os "downloads" gratuitos ("eu
mesmo faço") e a tendência de
confinamento do jazz aos selos de
pequeno porte. Leia trechos.
Folha - Quase sempre que se pergunta a um músico de jazz como será seu show ele responde que vai
decidir um pouco antes do começo
do espetáculo. Você vai decidir um
pouco antes do espetáculo?
Roy Hargrove - Você nunca sabe
até a hora que você sabe (risos).
OK, só sei que tudo o que vamos
tocar será novinho em folha. Vou
tentar algo diferente, vou expor
minhas últimas descobertas.
Folha - Como você descreveria o
tipo de música que você faz hoje?
Hargrove - Mais do que a mudança do meu tipo de música desta vez tenho um grupo novo. De
meu baixista [John Lee], por
exemplo, sei que trabalhou na
banda de Dizzy Gillespie, então
talvez toquemos algo dele. O pianista é um brasileiro, o Guilherme
[Vergueiro]. Deveremos usar algo
dele também.
A música brasileira é um novo
universo que estou descobrindo.
Conheço alguns músicos, como
João Gilberto, Gilberto Gil e Djavan, mas não vou muito além. Espero que este verão amplie meus
horizontes sobre a música daqui.
Folha - Em cada disco seu você parece outro músico. Este "camaleonismo" é natural ou você muda por
pressões de mercado?
Hargrove - Mais importante do
que mudar é crescer. A maior parte do tempo que eu gravo faço um
esforço muito grande para desenvolver novos caminhos musicais.
Camaleão, hahaha.
Folha - Seu "descobridor",
Wynton Marsalis, é bem pouco camaleônico. Você parece olhar sempre para a frente; ele está sempre
virado para a tradição. O futuro é
melhor do que o passado?
Hargrove - Eu também estou
muito ligado à tradição, mas não
de modo tão aderente. Acredito
que a tradição é muito importante
para a construção da fundação, os
pilares sobre os quais você constrói sua edificação. Mas em outros
aspectos sou totalmente diferente
de Marsalis. Acredito que o artista
tem por obrigação estar aberto.
Nos tempos em que vivemos as
pessoas ficam muito em suas casas, compram coisas pelo computador, não interagem. Não há natureza, não há interesse pela camaradagem. As pessoas não se
encontram, ficam todas isoladas.
Minha música trabalha pela integração das pessoas e para isso é
fundamental estar aberto.
Folha - Você falou em comprar
coisas pelo computador. Hoje um
amigo, dono de mais de mil CDs de
jazz, disse que ganhou um iPod e
não tem planos de comprar mais
nem um disco. Você está "aberto"
para esta nova realidade?
Hargrove - É uma questão muito
difícil. Eu mesmo faço downloads
gratuitos, mas também compro
os CDs de músicos de quem eu
gosto. Se as pessoas não comprarem os discos os artistas vão ser
prejudicados na outra ponta da linha. A indústria fonográfica teria
de elaborar um sistema de cobrar
copyrights pelos downloads, mas
até agora as dezenas de gênios
contratados por ela para isso não
chegaram perto.
Folha - Em entrevista recente à
Folha, o saxofonista Brandford
Marsalis falou que a saída para o
jazz estava em pequenos selos, como o que ele mesmo criou. O que
você, que é de uma grande gravadora, acha disso?
Hargrove - Esta é definitivamente a tendência do jazz. Os pequenos selos estão crescendo muito.
Hoje, curiosamente, já é possível
dizer que o mercado independente está se tornando o "mainstream" (corrente principal).
Folha - Uma pergunta eterna sobre o jazz é a durabilidade do gênero. Alguns defendem que ele é como o latim, uma língua morta. Outros, como Oscar Peterson, dizem
que o jazz está renascendo. Qual a
sua opinião sobre isso?
Hargrove - É realmente um debate sem fim, que começou quando o jazz deixou de ser um gênero
popular. Tenho certeza de que independentemente disso é um tipo
de música que nunca vai sumir.
Ele funciona como base para
qualquer estilo. É claro que cada
vez será mais difícil, como já é, ficar rico tocando jazz. Mas sempre
será uma forma de expressão. A
improvisação que vem do jazz é
basicamente composição expontânea, é criar música a partir do
ar. Se você tem a ferramenta para
isso pode fazer o que mais quiser.
ROY HARGROVE. Onde: Bourbon Street
Music Club (r. dos Chanés, 127, Moema,
São Paulo, tel. 0/xx/11/5095-6100).
Quando: hoje, às 21h e às 23h30.
Quanto: R$ 75.
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