São Paulo, sexta-feira, 19 de janeiro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Cinema

"Azur e Asmar" revê status do imigrante

Michel Ocelot, autor de "Kiriku e a Feiticeira", diz que buscou colocar o espectador na mesma situação dos personagens

Ao vetar a tradução dos trechos falados em árabe, cineasta sustou venda do filme à Alemanha, para não "menosprezar" o público


DA REPORTAGEM LOCAL

Por vontade de ser "um pouco insolente e um pouco elegante", o cineasta francês Michel Ocelot determinou que não deveriam ser nem traduzidos nem dublados os trechos falados em árabe em sua animação "As Aventuras de Azur e Asmar", que estréia hoje.
"É um filme sobre ser ou não ser imigrante. Boa parte dos problemas do imigrante vem do que ele não compreende. Quis colocar o espectador nessa situação", afirma o diretor.
Além de proporcionar a identificação do público ora com Azur ora com Asmar -garotos que cruzam alternadamente o oceano, tornando-se imigrantes em momentos distintos-, a escolha do árabe por Ocelot tem também a função de "celebrar a civilização muçulmana, que passou por essa língua".
Na Alemanha, ofereceram uma boa soma de dinheiro pelo filme, desde que ele pudesse ser todo traduzido. Ocelot disse que "foi duro, mas disse não". A justificativa: "Para mim, isso é mau comércio. Se meus filmes tentam dar dignidade às pessoas e se acredito nisso, não posso menosprezar o público".
A autonomia de Ocelot, porém, tem muito a ver com o notável sucesso comercial de seus filmes. "Kiriku e a Feiticeira" (98) foi um um êxito tão grande nas salas que virou franquia. Acaba de ser aberta em Paris uma loja temática Kiriku.
Sem abandonar Kiriku, Ocelot começou a preparar "Azur e Asmar" em 2001. Quando o WTC ruiu, no 11 de Setembro, o diretor estava reunido com sua equipe de desenhistas.
"Pensei: os problemas entre o Ocidente e os países muçulmanos não começam aqui, vêm de séculos. Mas o horror aumenta. É preciso fazer esse filme logo", conta.
O longa conta a história de um garoto loiro e rico, cuja babá (Jenane) tem um filho (Asmar) da mesma idade que ele.
Os meninos crescem como irmãos, amando-se e brigando muito, até que o pai de Azur expulsa Jenane e Asmar de casa, e interna Azur num colégio.
Adulto, Azur cruza o oceano, para ver de perto o cenário das histórias que a babá lhe contava e a reencontra, agora como uma próspera comerciante. Com Asmar, ele retoma a relação de amizade e disputas.
O filme foi exibido em mostra paralela do Festival de Cannes 2006, em que a imigração foi tema de dois filmes concorrentes à Palma de Ouro -"Babel" e "Dias de Glória".
Não fosse uma animação, "Azur e Asmar" disputaria a Palma? "Essa questão põe o dedo na ferida. Pergunto se não sou reconhecido como cineasta porque faço animação. Mas isso aos poucos muda. A animação tem feito progressos com o público", diz. Que o diga "A Era do Gelo 2", do brasileiro Carlos Saldanha, líder de bilheteria no Brasil em 2006. (SA)


Texto Anterior: Thiago Ney: O valor do amanhã (no pop)
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.