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ANÁLISE
"Mulheres" reforça opção folhetinesca
ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA
Fugir da rotina mantendo um
estado de paixão permanente
é o sonho das personagens da nova novela das oito da Globo. A
conversa das três irmãs protagonistas, interpretadas por Christiane Torloni, Maria Padilha e Giulia
Gam, expressa o desejo empobrecido de uma época carente de
grandes utopias.
O primeiro capítulo de "Mulheres Apaixonadas" foi carregado
-não em efeitos especiais ou em
cenas gravadas em algum distante
país estrangeiro. Sem grandes novidades, a novela de Manoel Carlos aposta no hipertratamento do
cotidiano da classe média alta do
Rio de Janeiro.
Parto natural com direito a sangue e cordão; casamento de conveniência em grande estilo
Gatsby, nos jardins de uma fazenda imponente; e velório e enterro
rodrigueanos, com direito a acusações ao pai que enviuva, caixão
reaberto à beira da sepultura, o filho revoltado que se despede dos
lábios da mãe debaixo de chuva.
O tom pastel suave -Vinicius
de Moraes em Itapoã- é bem
temperado. A novela é permissiva
no linguajar, na sugestão de nudez, nas relações levemente incestuosas. Helena, professora delicada, mulher do músico protagonista, patroa-comadre, expressa
sua insatisfação com a rotina. Um
casamento aparentemente invejável como o dela não é suficiente.
Falta "tesão". Sua irmã vibra com
a afirmação familiar que ecoa seus
prezados "sonhos eróticos".
O apelo aos mais velhos, alvo do
marketing social dirigido à terceira idade, presente no casal de velhinhos avós, vigora também na
sensualidade liberada dos personagens de meia-idade.
Rico em banhos, que os "reality
shows" transformaram em cenário corriqueiro, o capítulo teve
Suzana Vieira na banheira, de
portas abertas, assistida por fiéis
empregados carpinteiros, e Tony
Ramos em chuveirada regada a filosofia sobre o talento, na companhia do filho pequeno, além de
Rodrigo Santoro em apaixonada
despedida de solteiro.
A novela se apóia em um elenco
rico em nomes da TV, do teatro e
do cinema. Regina Braga e Xuxa
Lopes aparecem ao lado de José
Mayer e Cláudio Marzo. Santoro
faz um galã mimado, desocupado, conquistador, que prestes a se
casar com a garota que engravidou, força os afagos da prima (Camila Pitanga). A noiva, Paloma
Duarte, é dondoca de pouca substância na vida.
Na briga pela cada vez mais difícil audiência, a nova novela reforça a opção folhetinesca que fez o
sucesso do gênero no Brasil. De
volta ao tempo contemporâneo,
ela capta e expressa, por exemplo,
a ânsia pela ampliação da representação da diversidade racial, caprichando na escalação de atores
negros.
Exemplar bem realizado de
uma tradição, a novela encarna as
limitações de um imaginário centrado no amor romântico, que a
indústria cultural se encarregou
de difundir como ideal possível. A
valorização do universo privado,
usualmente associado ao domínio feminino, remete à mulher.
Outros títulos em exibição ou
prestes a estrear na mesma emissora, como "A Casa das Sete Mulheres" e "Cidade das Mulheres",
confirmam uma ênfase redundante. A insistência pode oferecer
um alento momentâneo, mas o
fôlego é curto. E o tédio espanta.
Esther Hamburger é antropóloga e
professora da ECA-USP
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