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Montagem beira teatro do absurdo de Beckett
Ópera Seca estreia em Curitiba "Travesties", primeira peça sem Gerald Thomas
Texto do britânico Tom Stoppard traz lembranças de encontro entre Lênin, Tristan Tzara e James Joyce em Zurique, em 1917
GUSTAVO FIORATTI
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA
"Travesties" não é uma peça
fácil, diz Caetano Vilela, braço
direito de Gerald Thomas na
Companhia de Ópera Seca. Ele
dirige o grupo pela primeira vez
para montar o texto do britânico Tom Stoppard -com estreia
hoje, às 21h, e reprise amanhã,
às 21h, em Curitiba. As dificuldades começam pela rejeição
do título entre possíveis patrocinadores. "Muita gente via o
nome e, de cara, falava "não".
Até pensamos em outras traduções", conta Vilela.
Daria uma boa discussão sobre preconceito, mas não é o
caso. A peça sequer fala sobre
homens que se vestem de mulher ou que colocam peitos de
silicone. A palavra "Travesties"
se refere a um tipo de encenação burlesca e caricatural -ok,
peruca vale, então- ,que hoje
muita gente conhece por "farsa". Os quiproquós das peças de
Oscar Wilde, por exemplo, são
diretamente mencionados.
Segundo ponto de dificuldade: o texto traz esse semblante
da farsa -gênero cômico e popular por natureza- de forma
verborrágica e labiríntica. A
história segue as lembranças de
um funcionário da embaixada
britânica em Zurique, Henry
Carr, sobre um encontro entre
o revolucionário Lênin (1870-1924), o precursor do dadaísmo
Tristan Tzara (1896-1963) e o
escritor James Joyce (1882-1941) naquela cidade, em 1917.
Henry Carr não é um personagem inventado, e os outros
três de fato viveram em Zurique no período, embora não haja registros do encontro. "Stoppard escolheu a personalidade
menos expressiva e menos talentosa para colocar no centro
do enredo", diz Vilela.
Gaveta
A memória de Carr dá voltas,
retorna a cenas já visitadas,
trai-se o tempo todo. Resta ao
espectador embarcar não numa trama de detalhes históricos, mas numa ficção, que, com
a Ópera Seca, pende para o teatro absurdo de Samuel Beckett.
"Lênin começa a peça saindo da
gaveta", ilustra Vilela, que
mantém a linguagem imagética
de Gerald Thomas.
A base da encenação ainda
traz referências de óperas, com
cenário de William Pereira, já
habituado ao gênero como cenógrafo e diretor. Talvez, no
entanto, com um pouco mais
de liberdade. A referência no
texto a uma biblioteca em cena,
logo no primeiro ato da peça,
foi representada por uma chuva de livros. Seiscentas unidades, no total, caem ao palco para depois continuarem em cena, só que suspensas por fios.
O diretor Vilela também tem
sua bagagem abastecida no
mundo da ópera. Por 11 anos,
esteve à frente do Festival
Amazonas de Ópera (FAO). E
dirige óperas desde 2002, entre
elas, "Lady Macbeth of the
Mtsensk District" (Shostakovitch) e "Ça Ira", de Roger Waters, ex-Pink Floyd.
Não é um cara polêmico como Gerald Thomas, que já desdenhou do Festival de Curitiba
em um apresentação no próprio evento, em 2000. "Prefiro
usar minha energia no palco, e
não fora dele", brinca Vilela.
O jornalista GUSTAVO FIORATTI viaja a convite
da organização do Festival de Curitiba
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